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Hugo Maia
Hugo Maia, diretor da Glintt Inov (Foto: Divulgação)

“A tecnologia pode tornar o acesso à saúde mais facilitado” – Hugo Maia

Por: Catarina Lopes Ferreira

Em entrevista à PME Magazine, Hugo Maia, diretor da Glintt Inov, fala sobre as novas tecnologias utilizadas para promover tratamentos de saúde à distância, numa época em que existe a necessidade de distanciamento físico devido à pandemia.

PME Magazine (PME Mag.) – De que forma se utiliza a tecnologia para monitorizar e promover tratamentos de saúde à distância?

Hugo Maia (H. M.) – A inovação na área da monitorização à distância tem crescido de forma muito significativa nos últimos anos. A tecnologia que existe hoje é mais acessível, quer em termos de custo, quer em termos da sua disponibilidade em maior número de locais por todo o mundo. Temos sensores mais pequenos e mais portáteis, com capacidade de monitorização de um cada vez maior número de parâmetros. Temos baterias mais eficientes, com maior autonomia e em menor dimensão e peso. Não nos podemos esquecer que a tecnologia das redes de comunicação prepara-se para dar um salto gigante com a introdução do 5G. Tudo isto tem permitido a introdução de conceitos como o “Internamento domiciliário”, pois é possível uma monitorização constante e em tempo real dos principais parâmetros físicos e bioquímicos. Assim, podemos ter doentes “internados” no conforto do seu lar, e monitorizar a evolução do seu estado de saúde num hospital central. Os sistemas de teleconsulta permitem manter a proximidade do médico de família, promovendo o conforto da regularidade do contacto e da necessidade de respostas às dúvidas que surgem com os tratamentos, ou com a evolução do processo de saúde. As aplicações com recursos de Realidade Aumentada ou assistentes virtuais, permitem manter um acompanhamento regular dos doentes, promovendo a adesão terapêutica de forma eficiente, promovendo o ensino em saúde ou a monitorização sobre a realização dos exercícios prescritos, conduzindo o doente na sua execução e incentivando-o para o alcance de metas sobre a sua recuperação. Estes são apenas pequenos exemplos de como a tecnologia pode tornar o acesso à saúde mais facilitado ou mesmo disseminado por um conjunto maior de pessoas.

PME Mag. – De onde surge essa necessidade e que adaptações é que a Glintt teve de fazer face à nova realidade?

H. M. – Embora todas estas tecnologias começassem já a ser utilizadas, o principal motor desta necessidade surgiu com a mais recente pandemia da Covid-19. As adaptações que fizemos, para além das que impactam diretamente a vida dos nossos colaboradores, fornecedores e clientes, foi procurar introduzir este fator no desenvolvimento dos nossos projetos. Hoje é assim fundamental introduzir um fator “X” no que fazemos, que é pensar que os utilizadores da nossa tecnologia têm a necessidade de contactar com a mesma em diferentes contextos e de forma remota. Poder trabalhar em ambientes web e cloud based é condição obrigatória, assim como a garantia de compatibilidade entre diferentes sistemas ou linguagens. Isto levou-nos a encetar um processo de transformação e adaptação de alguns dos nossos produtos, nomeadamente aqueles que têm um maior histórico de introdução nas unidades de saúde nacionais. A ligação e o contacto com algumas start-ups na área de Digital Health permitiram-nos ganhar vantagem e acelerar este processo de transformação, pelo que estamos hoje em condições de responder aos mais exigentes requisitos do contexto atual. 

PME Mag. – De que maneira é que as startups podem olhar para as novas apps como um instrumento de suporte em tomadas de decisão da sociedade e como uma ferramenta para alavancar negócios?

H. M. – Não me parece que se possa generalizar a utilização de tecnologia de forma tão direta. Mas de facto existe hoje um conjunto de aplicativos que permitem acelerar o retorno das empresas, nomeadamente na gestão da componente mais operacional, desde sistemas de pagamentos, sistemas de agendamentos e quase sempre pelo conceito da “Acessibilidade Eficiente” – são normalmente sistemas de baixo custo e que dão resposta cabal a uma determinada necessidade. Na área da saúde digital, por exemplo, uma destas tecnologias ou “commodities” é a utilização de sistemas de triagem com recurso a chatbots, que permitem diferenciar entre casos urgentes e não urgentes, permitindo a ligação posterior a sistemas de agendamento de consultas.

PME Mag. – Quais as principais razões pelas quais a Glintt INOV aposta e pretende continuar a apostar no desenvolvimento deste tipo de aplicações?

H. M. – Hoje é possível perceber que a prestação de cuidados e a gestão dos processos de saúde são conceitos que se estendem muito para lá das paredes físicas dos hospitais. Os cuidados especializados já não são exclusivos da centralidade dos grandes Hospitais-Universidade. A maior acessibilidade a este conhecimento, facilitado com o aparecimento das redes de comunicação, da Internet e das plataformas colaborativas, está ao dispor de um maior número de pessoas e permite a sua disseminação através de um conjunto de simples aparelhos e apps. A título de exemplo, hoje já é possível fazer rastreios populacionais em zonas remotas do país, só com recurso a um smartphone. Estas são tecnologias do futuro com aplicação prática no presente e a Glintt quer manter-se atualizada face às necessidades da nossa sociedade e dos nossos clientes da área da saúde que a servem. Esta estratégia tem motivado a Glintt a participar num conjunto de projetos colaborativos, em consórcios nacionais e internacionais, que têm como objetivo criar e desenvolver tecnologias que permitam materializar a visão da prestação de cuidados à distância. Desde o desenvolvimento de sensores para a monitorização em âmbito de internamento, a sistemas de alarmística e monitorização na triagem, rastreio de pessoas e equipamentos, teleconsulta e telemonitorização, até sistemas de previsibilidade de consumo de materiais e medicamentos. Atualmente estamos envolvidos em oito projetos diferentes, com um valor de investimento que ultrapassa os 5,4M€.

PME Mag. – Que retorno pode trazer esta aposta para a saúde pública?

H. M. – Na minha opinião este retorno deverá ser sempre medido com base em escalas quantitativas e qualitativas. Este tema da prestação de cuidados remotos levanta algumas dúvidas sobre a sua eficácia, quando comparado com o sistema tradicional presencial. Também não acredito que tudo possa ser feito de forma remota. É impossível. Mas existem vários processos que podem ser. Deixe-me dar o exemplo da medicação em ambulatório hospitalar. Algumas pessoas, pela natureza e especificidade da sua patologia, têm direito a recolher a sua medicação de forma gratuita, mas apenas em hospitais centrais de referência. Este processo, “presencial”, obrigava algumas destas pessoas a terem de se deslocar mais de 200 Km num determinado dia por mês, tendo para isso que abdicar de um dia de trabalho. Com o aparecimento da pandemia, surgiram alguns projetos piloto, nomeadamente com Santa Maria e São João, em que foi possível protocolar com as farmácias comunitárias da zona de residência dos doentes, a dispensa destes medicamentos. A tecnologia permitiu que as receitas fossem transmitidas, que o processo logístico fosse adaptado, e que o doente pudesse ter uma visão sobre o circuito do medicamento, podendo a qualquer altura tirar dúvidas com o médico ou o farmacêutico do serviço hospitalar. Este é apenas um exemplo de como é possível melhorar a saúde pública, através da introdução de inovação com base em processos colaborativos. E esta parece-me ser a receita certa para o futuro!

“Algumas pessoas, pela natureza e especificidade da sua patologia, têm direito a recolher a sua medicação de forma gratuita, mas apenas em hospitais centrais de referência. Este processo, “presencial”, obrigava algumas destas pessoas a terem de se deslocar mais de 200 Km num determinado dia por mês, tendo para isso que abdicar de um dia de trabalho”