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Raquel Matos e Sandra Laranjeiro dos Santos (Divulgação)

Covid-19: Impactos fiscais nas empresas

Por: Raquel Rodrigues de Matos e Sandra Laranjeiro dos Santos, LS Advogados, RL

A Organização Mundial de Saúde considerou, no passado dia 30 de janeiro de 2020, que a epidemia SARS-CoV-2 causou uma situação de emergência de saúde pública de âmbito internacional, tendo, no dia 11 de março de 2020, caracterizando o vírus como uma pandemia em virtude do elevado número de países afetados.

Com o intuito de mitigar o impacto do surto epidémico, o Conselho de Ministros, no transato dia 13 de março, aprovou um conjunto de medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica do novo Coronavírus — Covid-19, das quais, para o que ora releva, destacamos as seguintes medidas:

  • Prorrogação do primeiro pagamento especial por conta para o dia 30 de junho (ao invés de 31 de março);
  • Prorrogação da data de entrega do Modelo 22 do IRC para dia 31 de julho (ao invés de 31 de maio);
  • Prorrogação do primeiro pagamento por conta e do primeiro pagamento adicional por conta do IRC para dia 31 de agosto (ao invés de 31 de julho);
  • A atribuição de um apoio extraordinário à manutenção dos contratos de trabalho em empresa em situação de crise empresarial, no valor de dois terços da remuneração, assegurando a Segurança Social o pagamento de 70% desse valor, sendo o remanescente suportado pela entidade empregadora – regime análogo ao lay-off;
  • A promoção, no âmbito contributivo, de um regime excecional e temporário de isenção do pagamento de contribuições à Segurança Social durante o período de lay-off simplificado por parte de entidades empregadoras até um teto máximo de 1.905,00 euros;
  • A previsão de uma linha de crédito para as micro, pequenas e médias empresas no valor máximo de 1,5 milhões de euros por empresa, num montante total de 200 milhões de euros. A versão atual destas linhas de crédito pode ser analisada aqui.

Porque a pandemia ganha contornos no dia-a-dia que desafiam não só o Sistema Nacional de Saúde, como a economia nacional, no dia 18 de março, o ministro das Finanças anunciou mais um conjunto de medidas de incentivo à economia, com impacto fiscal direto na tesouraria das empresas nacionais.

Num discurso em que começou por referir que “é a hora de conter e tratar a doença, mas também de garantir apoio à liquidez das empresas, particularmente, pequenas e médias, e o apoio a trabalhadores e às famílias que já sentem o impacto das medidas adotadas”, Mário Centeno referiu que a linha de crédito de 200 milhões de euros iria ver as suas condições revistas e flexibilizadas e anunciou mais um conjunto de medidas de estímulo económico destinadas a apoiar as empresas e os trabalhadores independentes com atividade empresarial – a saber:

1. Lançamento de linhas de créditos adicionais disponibilizadas através do sistema bancário – e que deverão estar disponíveis em breve – para os seguintes setores:
– Para a restauração e similares, linha de crédito de 600 milhões de euros, dos quais 270 milhões para micro e pequenas empresas;
– Para o setor do turismo, linha de crédito de 200 milhões de euros, dos quais 75 milhões para micro e pequenas empresas;
– Para o subsetor do alojamento e empreendimentos turísticos, linha de crédito de 900 milhões de euros, dos quais 300 milhões para micro e pequenas empresas;
– Para o setor da indústria, nomeadamente têxtil, calçado, indústria extrativa e fileira da madeira, linha de crédito de 1.300 milhões de euros, dos quais 400 milhões para micro e pequenas empresas;

Estas linhas de crédito terão um período de carência até ao final do ano e podem ser amortizadas em quatro anos, e seguem as regras dos auxílios de Estado.

2. Flexibilização do cumprimento de diversas obrigações administrativas no âmbito de certificações, licenciamentos, etc.

3. Aceleração no pagamento dos incentivos financeiros no âmbito do QREN.

4. Flexibilização das condições de pagamento do IVA mensal/trimestral referentes ao segundo trimestre de 2020, bem como das retenções na fonte, para os contribuintes (empresas e particulares) com volume de negócios até 10 milhões de euros em 2018, ou que tenham iniciado a atividade a partir de 1 de janeiro de 2019, passam a poder ser pagas de três formas diferentes:
– Pagamento integral, e dentro do prazo normal;
– Em três prestações mensais, sem a aplicação de juros ou qualquer penalidade;
– Em seis prestações mensais, com a aplicação de juros nas últimas três prestações.

As empresas que optem pelo pagamento através de planos prestacionais não estarão sujeitas a prestar qualquer garantia.

Por se tratar de condições de flexibilização de pagamento, estas medidas aplicar-se-ão apenas às obrigações que se vencerem (a pagamento) no segundo trimestre, ou seja, aquelas que serão pagas em abril, maio e junho.

Já as que se encontram a pagamento em março, não beneficiam
deste regime, pelo que as empresas e trabalhadores individuais terão de as
assegurar in tottum [n. d. r. na totalidade].

As empresas e particulares com volume de negócios que ultrapassem os 10 milhões de euros em 2018 desde que comprovem que tiveram uma redução de pelo menos 20% na média dos três meses anteriores ao mês em que exista a obrigação de pagamento, face ao período homólogo do ano anterior, podem requerer igualmente uma das três modalidades acima para o pagamento das suas obrigações fiscais.

5. As contribuições à Segurança Social são reduzidas a um terço, nos meses março, abril e maio de 2020 para as entidades empregadoras até 50 postos de trabalho, podendo estender-se aquelas que têm até 250 postos de trabalho, desde que comprovem que tiveram uma redução de pelo menos 20% do seu volume de negócios.

O remanescente das contribuições, dois terços, relativo aos meses de abril, maio e junho, é liquidado a partir do terceiro trimestre, i.e. a partir de julho de 2020, nos mesmos termos aplicáveis ao IVA e retenções na fonte (ou seja, com as três opções de pagamento conforme exposto anteriormente).

Reforça-se que esta medida aplica-se às contribuições a pagamento no segundo trimestre, ou seja, aquelas que serão pagas em abril, maio e junho (referentes às contribuições de março, abril e maio respetivamente), pelo que as contribuições a pagamento em março terão de ser pagas in tottum.

6. Ficam suspensos por três meses os processos de execução fiscal e contributiva que estejam a decorrer, ou que venham a ser instaurados no decorrer da crise Covid-19.

7. Eliminação de taxas mínimas e valores mínimos de pagamento por POS, tendo sido todos os cidadãos e empresas aconselhados a não utilizares numerário nas transações, dado que as notas e moedas foram detetadas como sendo uma fonte de contágio do vírus Covid-19.

As medidas em causa visam sobretudo acautelar o reforço da capacidade de reação e contenção da propagação da doença, com o intuito de mitigar os efeitos económicos nefastos que se prevêem advir da tomada destas medidas de reação e contenção.

São medidas de carácter preventivo e excecional, tratando-se da “primeira linha de combate” da recessão económica que se avizinha, e que tanto assolará as pequenas e médias empresas. Com a sua aprovação, pretende-se apoiar a tesouraria das empresas, garantir que os postos de trabalho se mantêm e assegurar que as obrigações fiscais são cumpridas (ainda que
prorrogadas no tempo).

Sendo ainda incertas as consequências que advirão do impacto do Covid-19 em Portugal, nomeadamente no que concerne à sua duração e propagação, urge, por parte das empresas, a delineação de estratégias com vista a fazer face à crise económica que se avizinha – e que se crê atingir dimensões iguais ou superiores à crise económica que assolou o país em 2007 – de forma a assegurar o cumprimento das suas obrigações, sob pena de virem a ser aplicadas as devidas contra-ordenações.