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Presidente da ATP defende reforço dos apoios ao setor têxtil (Foto: Divulgação)

“Empresas vão ter de resistir num cenário adverso muito difícil” – Mário Jorge Machado

Por: Ana Rita Justo

O setor têxtil foi profundamente afetado pela quebra de atividade com a Covid-19. A certificação para produção de máscaras sociais e equipamentos de proteção veio ajudar, mas a incerteza ainda é grande. Mário Jorge Machado, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP) revela as principais preocupações do setor.

PME Magazine – Que impacto no setor teve a certificação para a chamada máscara social?

Mário Jorge Machado – Uma grande percentagem (cerca de 70%) de empresas do setor têxtil e vestuário aderiu ao lay-off simplificado, total ou parcial, em consequência de uma drástica redução na procura, não havendo ainda expectativas positivas face a uma retoma da atividade no setor. A produção de máscaras sociais (e de outros equipamentos de proteção individual ou artigos para a área hospitalar) permitiu que algumas empresas do setor continuassem a ter alguma atividade. Todavia, na maioria dos casos essa atividade não é suficiente para manter ativos todos os trabalhadores dessas empresas. Apenas umas centenas de empresas estão envolvidas na produção destes produtos. No último inquérito que fizemos, um quarto das empresas assinalaram estar a trabalhar nesta área.

PME Mag. – Pode partilhar connosco as principais conclusões desse inquérito?

M. J. M. – Das respostas que já recebemos, podemos partilhar o seguinte: 42% das empresas que responderam tiveram uma redução do volume de negócios superior a 50% em abril, sendo que as expectativas para maio se mantêm na mesma linha, com 36% das empresas a afirmar que terão uma quebra na faturação superior a 50%. 69% das empresas previam continuar em lay-off (total ou parcial) em junho.

PME Mag. – Quais as principais preocupações apresentadas pelas empresas?

M. J. M. – As empresas identificam a falta de encomendas, atrasos nos pagamentos por parte dos clientes, problemas de tesouraria, dificuldades no acesso aos apoios do Estado, com particular destaque para as dificuldades de acesso às linhas de crédito Covid-19. Há uma grande incerteza quanto à retoma nos próximos dois meses: apenas 8% das empresas acredita numa retoma da atividade com níveis superiores a 80%, até ao final do mês de julho; 19% acredita que a essa data poderemos ter uma retoma entre 60% a 80%; 25% antevê uma retoma entre 40% a 60%; 23% prevê que seja entre 20% a 40% e outros 25% estimam uma retoma da atividade inferior a 20%.

PME Mag. – Como estão as empresas do setor a reagir a esta nova realidade? O que mudou?

M. J. M. – Conforme referi, a realidade que ainda se vive no setor é pautada pela falta de procura e quebra nas encomendas, sobretudo de artigos de moda e têxteis para o lar, mas também nalguns produtos mais técnicos, como têxteis para o setor automóvel. Esta quebra de procura tem impacto em toda a cadeia de abastecimento, desde as matérias primas até ao produto final, passando pelas atividades de enobrecimento. Se pensarmos no vestuário ou têxteis para a casa, verificou-se uma quebra drástica no consumo deste tipo de artigos nos últimos meses, um pouco por todo o mundo (a maioria dos produtos fabricados em Portugal têm como destino mercados da União Europeia) e, apesar de estarmos a assistir a uma abertura gradual das lojas, há uma grande incerteza e falta de confiança quanto ao futuro, com muitas variáveis no desconhecido, como por exemplo, a possibilidade de um novo surto e de novas medidas restritivas e ainda o impacto da pandemia no nível do rendimento das famílias e incerteza quanto às suas prioridades e níveis de consumo. Neste contexto, é ainda difícil planear e antecipar as necessidades de produção. Face a este cenário de incerteza, acreditamos que as marcas, nos próximos tempos, irão privilegiar encomendas mais pequenas e fornecedores que sejam flexíveis e capazes de uma resposta rápida, atributos que caracterizam a indústria têxtil e vestuário portugueses. Todavia, até ao momento, a maioria das empresas deste setor vai ter de resistir num cenário adverso muito difícil, para o qual será fundamental o reforço dos apoios, nomeadamente na componente financeira.

Artigo originalmente publicado na edição de Julho de 2020