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Artur Salada Ferreira, administrador do Lisboa Biz (Foto: Inês Antunes)

“Olhe que não, olhe que não”

Por: Artur Salada Ferreira, administrador do Lisboa Biz

Seis de novembro de 1975. No momento em que escrevo este texto vêm-me à memória muitos factos que me estimulam a dar o meu testemunho.

É o fim do Processo Revolucionário em Curso (PREC) e o início da reposição dos verdadeiros ideais do 25 de Abril.

O país parecia tomado pelo Partido Comunista Português (PCP) que tentava controlar o poder em Portugal.

Tendo o apoio de uma larga fatia de elementos do MFA (Movimento das Forças Armadas) e, como partido organizado na clandestinidade, tomou de assalto muitas autarquias. Acresce que o primeiro-ministro, Vasco Gonçalves, era também afeto ao PCP.

Findo este período revolucionário, é resposto o caminho para a democracia. Os resultados das primeiras eleições vieram confirmar este facto, dando a larguíssima maioria dos votos dos eleitores ao Partido Socialista (PS) e ao Partido Social Democrata (PSD).

No decorrer do PREC, começou a ser notório que o objetivo do PC passava pelo controlo do Estado, a partir de 11 de março de 1975, com a nacionalização de praticamente toda a economia, sendo o PCP o mentor e motor dessa decisão, “mais ou menos” popular.

É neste contexto de pré-guerra civil que se realiza o debate do PREC, entre Mário Soares e Álvaro Cunhal.

Os líderes do PPD/ PSD – Francisco Sá Carneiro – e do Partido Popular (CDS-PP) – Diogo Freitas do Amaral – eram considerados de “direita” e não foram convidados para este (e muitos outros) momentos de debate.

Durante três horas e quarenta minutos, Mário Soares pôs em evidência a estratégia das “mais amplas liberdades” de Cunhal, que tinha dado uma entrevista a uma jornalista e escritora italiana, Oriana Fallaci, onde assumiu que a democracia ocidental não tinha lugar em Portugal, o que servia para dar força às interrogações de Mário Soares, que passaram a ser afirmações.

Sem argumentos para o desmentir, Cunhal responde então com a célebre frase: “Olhe que não, olhe que não…”.

Até hoje, o PCP não se coíbe de apoiar os amigos, como a união soviética “Sol do mundo” na boca de Álvaro Cunhal, e elogiar a Coreia do Norte e Cuba.

Acresce referir o seu antieuropeísmo que se mantém até hoje.

Não se entende a defesa que o PS continua a fazer do PCP, dizendo tratar-se de um partido democrático e defensor da liberdade e já não das “mais amplas liberdades”, que Cunhal defendia sem precisar o que tal significava. O modelo que pretendia implementar, caso tomasse o poder no 25 de Novembro, não veio a acontecer graças ao Grupo dos Nove, à liderança militar do general Ramalho Eanes e à execução do major Jaime Neves.

A 25 de novembro, o “Grupo dos Nove” foi liderado por Melo Antunes, que veio a público defender o PCP, grande perdedor do 25 de Novembro e que durante o PREC se achava “dono do país”.

Melo Antunes apelou à democracia dos vencedores. Nesse mesmo dia, após a vitória do “Grupo dos Nove”, Antunes fez um apelo à população no sentido de evitar a ilegalização do PCP e de um possível ajuste de contas.

Não posso deixar de referir o 11 de Março de 1975 em que os elementos do MFA, afetos ao PCP, simularam um ataque da “direita” levando o General Spínola a cair numa armadilha e fugir.

Estavam o pretexto e o caminho abertos para o PCP realizar o seu grande objetivo: nacionalizar toda a economia.

Cerca de uma década com a banca nacionalizada, com trabalhadores ao ritmo de funcionários públicos, contribuiu muito para o atraso de Portugal que ainda hoje se verifica.

Quem viveu este período do 25 de Abril de 1974 a 25 de Novembro de 1975, lembrando pelo meio o 28 de Setembro e o 11 de Março de 1975, tem dificuldade em ouvir o PS a defender o PCP, como fundador e defensor da democracia, tal como a vivemos hoje.

É indiscutível o contributo do PCP para o enfraquecimento do Salazarismo, apesar do objetivo de servir a União Soviética. E isso é também evidente na descolonização, onde o PCP conseguiu colocar camaradas militares que defendiam os seus princípios, entregues à União Soviética.

Todos temos direito a errar se estivermos dispostos a mudar e aceitar o erro.

Acontece que o PCP se apresenta na Assembleia como defensor da democracia, mas quando tem oportunidade identifica-se com Cuba e com a Coreia do Norte.

É ridículo assistir à condenação do PSD por aceitar o apoio do Chega, ao governo dos Açores e ao mesmo tempo implorar ao PCP que vote favoravelmente no orçamento do governo do PS.

É evidente que não me revejo no Chega, mas também não me revejo no PCP, sendo que este já fez muito contra a democracia e o Chega, por enquanto, é só discurso, por vezes xenófobo, mas algumas vezes dizendo aquilo que os outros não têm coragem de dizer, por complexo de esquerda.

O complexo de esquerda tem sido notório mesmo nesta fase de pandemia em que a ministra da Saúde só recorre ao setor privado em desespero de causa, quando, na minha opinião, deveria incorporá-lo num sistema nacional de saúde.

Há dias, chamei uma ambulância para transportar uma pessoa que estava com sintomas de problemas cardíacos e solicitei que o transportassem para a CUF Descobertas. Foi-me respondido que apenas podiam transportar para um hospital público.

Um seguro de saúde não vale de nada nestas circunstâncias. Parece haver um castigo para quem não usa o S.N.S.

Por quê este exemplo? Já todos percebemos que sem os seguros de saúde, o S.N.S entrava em colapso total.

Devo aqui declarar o meu apreço pelo S.N.S, ao qual recorro por opção, apesar de ter um seguro de saúde.

Será que vamos continuar com o complexo de esquerda na hora de tomar as decisões importantes para o país?

“Olhe que não, olhe que não…”