Quarta-feira, Dezembro 4, 2024
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“Queremos ser parte de um movimento que eleva os videojogos a uma forma de arte e expressão” – Calebe Motta

Por: Ana Vieira


O estúdio português Octopus Embrace, localizado em Lisboa, foi o criador do videojogo “Back Then”, lançado no último mês de novembro para a PlayStation 5.

O jogo narrativo coloca os jogadores na pele de Thomas Eilian, um escritor idoso que enfrenta os desafios da doença de Alzheimer. Desenvolvido durante quatro anos, e inspirado em experiências pessoais dos criadores, “Back Then” foi o primeiro jogo do estúdio independente.

Em entrevista à PME Magazine, Calebe Motta, criador e produtor de jogos, afirma a vontade da Octupus Embrace “desenvolver jogos que não apenas entretenham, mas também provoquem reflexão, e abordem temas relevantes para a sociedade”, acreditando existir “espaço e demanda para jogos que vão além do mero entretenimento”.

PME Magazine (PME Mag.) – Como surgiu a ideia de criar o jogo “Back Then” e o que inspirou a história?
Calebe Motta (C. M.) – Em 2019, participámos numa Global Game Jam, onde o tema era “Casa”. Foi aqui que surgiu a premissa inicial do “Back Then”: um idoso com Alzheimer, preso num lar de idosos, restrito a uma cadeira de rodas, tem de interagir com os seus pertences para poder lembrar-se do seu passado. Vimos o potencial do jogo, então após concluirmos a faculdade, decidimos continuar com o projeto e aprofundar a narrativa. No mesmo ano, acabámos por candidatar o jogo ao IndieX, onde ganhámos o prémio de “People’s Choice”; e ao programa PS Talents, onde ganhámos os prémios de “Games 4 Good” e “Melhor Jogo”.

Estes reconhecimentos foram uma agradável surpresa e um grande incentivo para continuarmos o desenvolvimento. Não era algo que estávamos à espera, mas ficámos muito felizes e motivados para levar o projeto adiante!


PME Mag. – Quais foram os maiores desafios e aprendizagens durante o desenvolvimento de “Back Then”? 
C. M. – Um dos maiores desafios durante o desenvolvimento de “Back Then” foi manter a motivação da equipa ao longo de um projeto tão prolongado, especialmente após termos de reiniciar o desenvolvimento do zero num determinado ponto durante a pandemia.

Outro grande desafio foi o corte significativo de conteúdo que tivemos de fazer. Isso incluiu um final secreto planeado, áreas que foram refeitas ou removidas, e quebra-cabeças e sequências inteiras que tiveram de ser redesenhados. Estas decisões difíceis são comuns no desenvolvimento de jogos, especialmente para uma equipa inexperiente no seu primeiro projeto.

“Enfrentámos diversos obstáculos e momentos de dúvida, mas cada desafio superado fortaleceu a nossa determinação”.

Mas a jornada ensinou-nos muito sobre persistência e resiliência. Enfrentámos diversos obstáculos e momentos de dúvida, mas cada desafio superado fortaleceu a nossa determinação. Além disso, aprendemos a valorizar a flexibilidade e a adaptabilidade, pois muitas vezes tivemos de ajustar os nossos planos e expectativas em resposta às circunstâncias em constante mudança da pandemia.

“(…) baseámos muito do conteúdo relacionado com o Alzheimer nas nossas próprias experiências pessoais”

No que diz respeito à informação médica ou científica, baseámos muito do conteúdo relacionado com o Alzheimer nas nossas próprias experiências pessoais, particularmente na minha vivência com a minha avó que faleceu da doença em 2016, e do meu avô que faleceu em 2021. Isto permitiu-nos retratar os efeitos da doença e escrever a narrativa de uma maneira mais íntima e autêntica.

PME Mag. – “Back Then” está disponível para PlayStation 5 e PC. Que retorno terá para a Octopus Embrace?
C. M. – O retorno que a Octopus Embrace terá com o lançamento de “Back Then” para a PlayStation 5 ainda é incerto, mas estamos bastante otimistas. Esperamos que o jogo seja bem recebido pelos jogadores e pela crítica, e que isso nos permita continuar a desenvolver jogos inovadores e significativos. Para além disso, acreditamos que esta experiência nos ajudará a estabelecer uma presença mais forte na indústria dos videojogos.

“(…) temos planos ambiciosos para o futuro”

O “Back Then” é o nosso primeiro jogo! É um marco importante para nós, representando anos de trabalho árduo e dedicação. Estamos muito orgulhosos do resultado e ansiosos para ver como os jogadores irão receber a nossa primeira criação. Embora seja o nosso único lançamento até agora, temos planos ambiciosos para o futuro e esperamos que o “Back Then” seja apenas o início de uma jornada emocionante no desenvolvimento de jogos.


PME Mag. – Qual é a visão da empresa sobre o futuro dos videojogos?
C. M. – Na Octopus Embrace, acreditamos que o futuro dos videojogos está na criação de experiências significativas e emocionalmente impactantes. Atualmente, a indústria é dominada por grandes produções AAA e jogos como serviço, que frequentemente priorizam gráficos impressionantes e mecânicas repetitivas em detrimento de narrativas profundas e inovação genuína. Observamos também exemplos claros de jogadores a rejeitarem grandes produções — como os jogos recentes da Ubisoft — em favor de experiências indie, como “Mouthwashing”.

“(…) provoquem reflexão, e abordem temas relevantes para a sociedade”.

Nossa visão é contribuir para uma mudança nesse paradigma. Queremos desenvolver jogos que não apenas entretenham, mas também provoquem reflexão, e abordem temas relevantes para a sociedade. Acreditamos que há espaço e demanda para jogos que vão além do mero entretenimento, oferecendo experiências que ressoam emocionalmente com os jogadores e deixam um impacto duradouro. Queremos ser parte de um movimento que eleva os videojogos como uma forma de arte e expressão, capaz de contar histórias poderosas e promover mudanças positivas.

No futuro, esperamos ver uma indústria mais diversificada, com mais espaço para estúdios independentes e projetos experimentais. Queremos contribuir para um cenário onde a inovação narrativa e a originalidade sejam tão valorizadas quanto os avanços tecnológicos, criando jogos que não apenas impressionam visualmente, mas também tocam o coração e a mente dos jogadores.


A indústria dos videojogos em Portugal tem crescido (23 milhões em 2022, AICEP). O que é que poderia contribuir para um maior desenvolvimento desta indústria no nosso país?
C. M. – Em primeiro lugar, um aumento nos incentivos fiscais e financeiros para empresas de desenvolvimento de jogos poderia atrair mais investimentos e estimular o crescimento de estúdios locais. A expansão de programas educativos focados em desenvolvimento de jogos, design e narrativa interativa nas universidades portuguesas também ajudaria a formar uma força de trabalho altamente qualificada para o setor.

“(…) elevadíssimo custo de habitação e os baixos salários que estão a travar o país”

Contudo, o fator mais crítico é o elevadíssimo custo de habitação e os baixos salários que estão a travar o país — estes impedem os jovens de construir uma vida em Portugal e forçam-nos a emigrar. Se estes problemas não forem resolvidos primeiro, o crescimento da indústria de videojogos em Portugal será a menor das preocupações.

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