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Ana Alves, Associate, Natural Resources da WTW Portugal

Setor energético: vivem-se tempos de incerteza e mudança

Por: Ana Alves, Associate, Natural Resources da WTW Portugal


Nos dias que correm, a incerteza e a mudança são dados adquiridos. As últimas décadas demonstraram-nos que nada é certo e que o que tomamos como certo hoje poderá não o ser amanhã. Como tal, quer as empresas, quer as pessoas enquanto indivíduos, têm de adaptar-se a esta realidade. E o setor energético não é exceção.


Aliás, é precisamente um dos setores da economia mais pressionado. Há vários anos sob escrutínio por parte da comunidade científica, que vinha a alertar para as consequências nefastas resultantes das indústrias poluentes assentes na utilização de combustíveis fósseis, nomeadamente carvão, petróleo e gás natural, viu-se confrontado com a necessidade de proceder a alterações profundas e urgentes nas suas operações.

97% da comunidade científica defende que a atividade humana é a principal responsável pelas alterações climáticas e o anómalo aquecimento global verificado no último século. Em conjunto com as instituições governamentais e internacionais, foi reconhecida a necessidade de limitar o aumento da temperatura média do planeta entre os 1,5ºC e os 2ºC acima dos níveis pré-industriais. No seguimento do Acordo de Paris, assinado em 2015, a União Europeia comprometeu-se a atingir a neutralidade carbónica até 2050.
Será este o ponto de viragem para o setor energético?

Perante as evidências científicas e a pressão da comunidade internacional, cabe aos governos e às empresas do setor energético agir rapidamente para permitir o cumprimento das exigentes metas e objetivos estabelecidos.

Para tal, é imprescindível que os governos se comprometam, desde logo, com medidas concretas para uma rápida e eficiente transição energética. Por um lado, é necessário que a política energética de cada país esteja assente em energias verdes, produzidas através de fontes renováveis. Devendo não só existir incentivos claros para a produção e utilização de energias limpas, como também financiamento para o desenvolvimento de novas tecnologias e infraestruturas. Por outro lado, é fundamental promover a autonomia energética, reduzindo assim a importação de energia e consequentemente a volatilidade dos preços praticados pelos mercados externos.

Neste cenário, as empresas do setor energético enfrentam diversos desafios, desde a instabilidade geopolítica, à atual pressão inflacionista que afeta as condições de financiamento, os custos de produção e todos os problemas inerentes às interrupções das cadeias de abastecimento. Os processos de licenciamento são igualmente vistos como um obstáculo à implementação de novos projetos de energia renovável, devido à sua morosidade e complexidade que resulta no afastamento dos investidores privados.

As crescentes ameaças de ataques cibernéticos são de extrema preocupação para o setor, que tem investido na automação das suas infraestruturas críticas e digitalização das redes de energia, podendo ver a sua operação comprometida, como foi o caso da Enercon. Também os fabricantes de turbinas eólicas Nordex e Vestas reportaram ataques cibernéticos nos últimos 2 anos.

Todavia, apresentam-se ainda várias oportunidades para o setor energético. No caso das indústrias de combustíveis fósseis, a diversificação do seu portfólio é inevitável. Um forte investimento em energias renováveis contribuirá para o aumento da sua produção e consumo, levando por sua vez à redução do custo de produção.

Temos assistido a um desenvolvimento tecnológico extraordinário, como é o caso do aumento da capacidade instalada de tecnologias mais maduras como a produção de energia fotovoltaica e eólica, sendo que existe uma margem elevada para crescimento, em particular no que respeita às centrais eólicas offshore, aos sistemas de armazenamento de energia e vetores energéticos, como o hidrogénio.
Com o aumento da produção de energias verdes e em virtude da sua sazonalidade e intermitência, devido a fatores climáticos e atmosféricos, é essencial acautelar a continuidade da operação, para que não se verifiquem quebras no fornecimento, garantindo assim a estabilidade e eficiência energética. Nesta ótica, temos assistido a um forte investimento em estações de armazenamento de energia, como é o caso do Reino Unido, que possui o maior sistema de armazenamento de baterias da Europa.

A urgência das alterações climáticas impõe às empresas do setor energético a necessidade de investir na descarbonização com vista a alcançar a sustentabilidade energética e ao cumprimento das exigentes metas climáticas impostas pela União Europeia. A capacidade das empresas em enfrentar os diversos desafios de forma eficaz depende da sua capacidade de adaptação, inovação e implementação de uma visão estratégica de longo prazo.