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Laetitia Arrighi de Casanova, diretora da B Lab Portugal
Laetitia Arrighi de Casanova, diretora da B Lab Portugal (Fonte Divulgação)

“Fazer parte do Movimento B Corp significa integrar uma comunidade ativa e comprometida” – Laetitia de Casanova

Por: Mafalda Marques e Ana Vieira


A B Lab é uma rede sem fins lucrativos que pretende transformar a economia em benefício das pessoas, comunidades e do planeta. Para fazer parte dela, é necessário passar por um processo de certificação que começa com o B Impact Assessment (BIA), uma ferramenta gratuita para todas as empresas e fornecer documentação sobre sua performance.

Em entrevista à PME Magazine, Laetitia Arrighi de Casanova, diretora da B Lab Portugal, fala numa “maneira de repensar como se fazem negócios, que orienta e equilibra os benefícios (que tradicionalmente vão para o acionista) para as pessoas, as comunidades e o nosso planeta”.

 

PME Magazine (PME Mag.) – O que é que significa pertencer ao Movimento B Corp?

Laetitia Arrighi de Casanova (L.A.C.) – É importante começar por explicar o que significa a letra B – Benefício para todos. A visão do movimento B Corp é de uma economia inclusiva, equitativa e regenerativa para as pessoas e para o planeta. Este movimento global reúne as empresas para transformar o nosso sistema económico e impactar positivamente todas as partes interessadas — colaboradores, comunidades, clientes e o nosso planeta.

É uma maneira de repensar como se fazem negócios, que orienta e equilibra os benefícios (que tradicionalmente vão para o acionista) para as pessoas, as comunidades e o nosso planeta.

As empresas certificadas, ou B Corps, são empresas que cumprem elevados padrões de desempenho social e ambiental, transparência e responsabilidade. Nesse sentido, fazer parte do Movimento B Corp significa integrar uma comunidade ativa e comprometida em incluir considerações sociais e ambientais nas decisões de negócios, e a fazer um caminho de progresso contínuo. É estar do lado do “Business for good”.

O compromisso com esta visão é materializado pelo facto das empresas serem obrigadas a mudar os seus estatutos sociais para integrar este novo propósito.

As empresas podem nascer com o espírito B Corp (ainda assim pode haver adaptações necessárias à certificação), noutras o processo de certificação leva a uma revisão de valores e formas de atuação que pode ser positivamente transformacional.

Uma vez certificadas, as empresas juntam-se a uma comunidade global superior a 7.500 organizações de mais de 160 setores de atividade junto das quais se podem inspirar, fazer negócios e trabalhar em conjunto em ações coletivas. Ser B Corp aporta um valor concreto para as empresas, como mostram os dados de um survey junto de comunidade em Portugal: reforça a resiliência do negócio em 50% dos casos, melhora a visibilidade sobre oportunidades de crescimento e de gestão do risco para 44% e impacta significativamente a estratégia de longo prazo para 57% dos respondentes.

 

PME Mag. – Em que consiste o processo de certificação de uma empresa?

L. A. C. – A certificação B Corp é um processo complexo que pode demorar apenas uns meses ou dois ou três anos, dependendo de fatores como a dimensão da empresa, a complexidade do negócio e as mudanças a implementar. O primeiro passo é invariavelmente responder às questões do B Impact Assessment (BIA) – ferramenta gratuita para todas as empresas, independentemente de serem B Corp ou não – e fornecer documentação sobre sua performance em cinco áreas de impacto: governação, trabalhadores, consumidores, comunidade e ambiental. Esta informação é verificada por analistas, que também avaliam os riscos da companhia ao longo da sua cadeia de operações.

As companhias precisam de atingir uma pontuação mínima de 80 pontos de 200 pontos possíveis para alcançar a certificação. Ao serem certificadas, as B Corps entram num quadro de melhoria contínua. Para manterem a sua certificação, as empresas devem recertificar-se de três em três anos, demonstrando que continuam a cumprir com as normas da B Lab – que estão sempre a ser melhoradas através da contribuição contínua de especialistas.

PME Mag. – Qual o alcance e perfil das B Corps em Portugal?

L. A. C. – Atualmente, a comunidade B Corp em Portugal é composta por cerca de 50 empresas: 30 B Corps portuguesas certificadas e 20 B Corps multinacionais com operações significativas em Portugal. Temos uma comunidade de empresas de mais de 10 setores de atividade: serviços financeiros (com destaque para financiamento de empresas de impacto), jurídicos, consultoria, Indústria Agro alimentar (toda a cadeia), têxtil e calçado, comércio, turismo e tecnologia. Contamos também com diversidade ao nível da dimensão das organizações, com algumas grandes empresas, muitas PME dinâmicas e inovadoras e alguns grupos familiares.


PME Mag. – Com a nova liderança para Portugal, coordenada por Laetitia Arrighi de Casanova, quais serão as principais linhas orientadoras?

L. A. C. – Começo por dar um contexto de como chegámos até aqui: em abril deste ano iniciou-se um processo público para nomear uma nova liderança em Portugal durante o período de dois anos. Concorreram 9 participantes e ganhou o consórcio que lidero, formado por três empresas (duas delas B Corps): Sair da Casca, Felicidad Collective e Maze.

A nossa missão é consolidar uma comunidade forte e dinâmica, reforçando a nossa credibilidade e influência. Temos três grandes prioridades: centrar-nos na comunidade ao dinamizá-la e ajudá-la a crescer, sendo para tal essencial dar mais visibilidade do movimento B Corp; fazer parcerias e trabalhar com associações, instituições públicas e privadas, universidades e think tanks com vista a ações coletivas de impacto; finalmente, faremos a ponte entre as equipas de certificação da B Lab global e as empresas que decidem abraçar este desafio.

Desde o lançamento, temos recebido contactos regulares por parte de empresas interessadas em conhecer o movimento, além de instituições de ensino e órgãos públicos e privados que nos estão a desafiar para diferentes ações tais como conferências, encontros com estudantes e executivos, workshops e programas de aceleração. Se já estávamos confiantes antes de aceitar o desafio, agora é claro para nós que a evolução em Portugal será bastante significativa nos próximos anos.


PME Mag. – Que impacto tem o Movimento B Corp e a certificação nas empresas e nas pessoas?

L. A. C. – Uma das grandes preocupações da B Lab é poder medir e analisar o impacto de todas as ações. Nesse sentido, partilho dados globais de 2022 que mostram bem que as B Corps marcam a diferença face a empresas que não têm a certificação.

Do ponto de vista ambiental, este relatório mostra que as B Corps são duas vezes e meia mais neutras em carbono que as restantes. No ano passado, a nossa comunidade global protegeu mais de 1 milhão de hectares de terra e compensou ou poupou 3 mil milhões de litros de água.

Comparadas com as outras empresas, as B Corps são também um exemplo ao nível corporativo: têm uma probabilidade quase cinco vezes maior de ter políticas de diversidade de fornecedores ou programas de fornecedores locais e com populações menos representadas e têm quase o dobro da probabilidade de gerir os salários de forma igualitária por género, raça e etnicidade.

Porque as ações coletivas fazem parte do nosso ADN, destaco duas grandes conquistas ao nível político do ano passado na Europa, como a Interdependence Coalition, onde se envolveram ativamente no extenso processo de evolução da proposta da Diretiva para a Corporate Sustainability Due Diligence (CSDDD) e emitiram uma resposta formal à Comissão Europeia sobre o projeto de proposta da Comissão. Aqui ao lado, os esforços espanhóis da Empresas con Propósito levaram a que o reconhecimento legal das Sociedades de Beneficência fosse incorporado na legislação nacional como já é o caso em França, Itália, e vários países da América Latina e estados norte-americanos.


PME Mag. – Qual o custo da certificação e a duração estimada?

L. A. C. – A primeira avaliação do B Impact Assessment (BIA) é feita de forma gratuita, dando assim oportunidade a que todas as empresas possam avaliar e melhorar o desempenho dos seus negócios. Posteriormente, se o desejarem, podem validar o score obtido com a B Lab global mediante pagamento de uma taxa de submissão. Este custo tem como objetivo ajudar a concentrar os processos de revisão em empresas que estão empenhadas em concluir a Certificação B Corp – é cobrado no momento em que as empresas submetem o seu primeiro BIA para revisão, sendo um momento de compromisso.

Uma vez B Corps, as empresas pagam uma taxa anual que é calculada com base na faturação da empresa. Este valor é proporcional à dimensão, começando nos 2.000€ (até 2,5M€) e indo até aos 50.000€ (a partir de 750M€).


PME Mag. – Vão publicar algum balanço anual sobre o Movimento em Portugal?

L. A. C. – Como referi antes, a B Lab está totalmente comprometida com a transparência. Vários dos dados que fui partilhando anteriormente foram extraídos quer do relatório Europeu (que em 2022 lançou o relatório de impacto pela primeira vez) quer do relatório global. Os dados principais sobre o movimento em Portugal podem ser encontrados e são frequentemente atualizados no site da B Lab Portugal.

De realçar também que inspiramos toda a nossa comunidade a medir, analisar e partilhar o seu próprio impacto, para criarmos um verdadeiro círculo virtuoso de sustentabilidade.

PME Mag. – Como pretendem cativar mais empresas para o Movimento?

L. A. C. – Para cativar mais empresas para o Movimento B Corp, é preciso demonstrar que as B Corps atuam e obtêm resultados significativamente diferentes das outras empresas, e por isso, dar a conhecer as suas realizações é muito inspirador. Temos empresas internacionais de sucesso, empresas nacionais inovadoras, casos de sucesso no impacto; o seu reconhecimento pelo mundo dos negócios, pelos consumidores e pelos colaboradores é um ponto diferenciador no mercado. Em matéria de atuação responsável no negócio, a certificação B Corp é uma referência internacional muito valorizada.

A B Lab Portugal é um conector, um facilitador e um acelerador para as empresas que se reconhecem nos valores e no propósito do movimento B Corp.