Vídeo: JD Edition
Por: Ana Rita Justo
Fotos: João Filipe Aguiar
Trabalhou na empresa do pai, tirou Direito e atirou-se de cabeça para um negócio que tinha tudo para correr mal. O associativismo levou-a ao mundo fantástico dos business angels, onde tira o maior prazer em investir e mentorar projetos novos. Aos 56 anos, Isabel Neves conta-nos o que é ser uma mulher empresária em Portugal e porque faz da mentoria uma missão.
PME Magazine – Começou cedo a trabalhar na empresa do pai. Como foi esse percurso?
Isabel Neves – Eu nasci numa família de pequenos empresários. O meu pai era pequeno comerciante, a minha tia era pequena comerciante, a minha avó era pequena comerciante… Portanto, nasci num meio em que todas as pessoas eram pequenos comerciantes e empresários e era quase um percurso natural nós participarmos nas tarefas que envolvem pessoas que estão neste meio. Lembro-me de ser muito pequena e participar em tarefas que me eram pedidas, sempre de uma forma muito natural, espontânea e por gosto. Era muito boa aluna e com 16, 17 anos comecei a dar explicações, depois fiz um curso de italiano e isso permitiu-me começar a fazer traduções.
A determinada altura fui trabalhar para a empresa do meu pai, que já tinha alguma dimensão, não como filha do patrão, mas como uma empregada mais. Fiz o meu percurso dentro da empresa, desde office girl, até ao pomposo nome de assessora da administração, aprendendo tudo o que há a aprender dentro de uma empresa, ao mesmo tempo que estudava.
Fiz a minha licenciatura em Direito, em Ciências Jurídico-económicas, escolhi logo a área mas económica [risos]. Acabei o curso em 1985, altura em que Portugal estava a aderir à Comunidade Económica Europeia (CEE). Falava-se muito em relações internacionais, direito comunitário, portanto, o meu primeiro objetivo era tirar uma pós-graduação em direito comunitário e fazer uma carreira de relações internacionais. Era o meu sonho, mas o bichinho pelas empresas fez-me ir ficando. Depois, fui convidada para assistente de direito fiscal e assumi a parte da administração da empresa do meu pai e fiquei responsável pela parte jurídica. Entretanto, houve um problema dentro da empresa que levou à divisão dos sócios e o meu pai ponderou comprar a empresa desde que eu ficasse. Nessa altura, quis dar o grito do Ipiranga [risos] e disse: ‘Não quero ficar na empresa, quero provar a mim mesma que consigo fazer a minha carreira na advocacia’. Era um tiro no escuro, porque não tinha advogados amigos, nem na família, era começar do zero. Na altura, o meu pai ficou um pouco magoado comigo, o que é normal quando se fazem estes cortes, mas comecei a minha atividade como advogada por conta própria.
PME Mag. – Em que ano se deu essa mudança?
I.N. – Desde 1987, 1988 passei a ser advogada por conta própria. Hoje, tenho uma pequeníssima sociedade de advogados, a Isabel Neves & Associados, porque está muito centrada em mim e nós não temos o dom da ubiquidade. Trabalhei sempre com pequenas e médias empresas, normalmente de empresários que confiam muito num advogado, confiam em mim e não nas pessoas que ponho a trabalhar comigo e é preferível manter uma determinada dimensão, do que crescer muito e não termos a possibilidade de responder a todos da forma que eles necessitam. Claro que o bicho das empresas ficou, casei e montei com o meu marido, que era economista, uma empresa de consultoria e investimento no turismo. Mantive a minha vida profissional enquanto advogada, mas também enquanto consultora nessa empresa, que já não existe. Nesse percurso, conheci a Associação Portuguesa de Mulheres Empresárias (APME), constituída pela dona Fernanda Pires da Silva, que é a mulher do Autódromo do Estoril, que tem o nome dela. A Fernanda esteve muitos anos no Brasil e tinha trazido para Portugal este conceito do associativismo empresarial feminino – na década de 80 estas coisas faziam muito sentido e ainda hoje parece que fazem. Conheci a dona Fernanda era muito nova, tinha 29 anos, e ela pediu-me para constituir o grupo de relações internacionais da APME e a partir daí entrei neste mundo do empreendedorismo feminino, das empresas, fiz muitos projetos internacionais, havia muito apoio da própria CEE para desenvolver projetos de âmbito de empreendedorismo feminino e estive muito envolvida em tudo isso.
A determinada altura, assumi a vice-presidência da APME, onde estive 18 anos e conheci imensas mulheres com projetos empresariais, outras que queriam começar os seus projetos, umas com ideias de negócios. Aprendi muito e fui tendo contacto com muitos projetos novos, com muita gente que tinha uma ideia, um projeto, queria pô-lo de pé e precisava de o financiar. É aí que cruza a minha atividade atual de business angel.
Fiz mentoria a jovens, mulheres e homens que queriam desenvolver os seus projetos, a única coisa que não fazia era financiá-los, mas tentava ajudá-los no desenvolvimento de uma estratégia de implementação e a encontrar fontes de financiamento. Conheci o Francisco Penha, que no final da década de 1990 trouxe para Portugal, desenvolveu e lutou imenso pelo conceito de business angel. Mais tarde, ele ‘picou-me’ para constituir o primeiro grupo de business angels mulheres, mas não me apetecia constituir nenhuma associação de género. Tinha pertencido, durante muitos anos, a associações de género e para mim já não fazia sentido. Acabei por constituir o Clube Business Angels de Lisboa, não numa perspetiva de género, mas porque achei que na altura a maior parte dos clubes de business angels estava mais vocacionada para a área tecnológica. E eu, com todo o percurso que tinha feito, achei que era interessante fazer aqui uma clivagem e aplicar este conceito a áreas mais tradicionais.
Leia a entrevista na íntegra na edição de abril da PME Magazine.