Por: Afonso Godinho
Numa altura em que celebra 20 anos da sua fundação, a empresa farmacêutica Bluepharma realizou um investimento de 200 milhões de euros para desenvolver os projetos dos próximos dez anos. Num ano marcado pela crise económica provocada pela pandemia Covid-19, a empresa apresentou um crescimento de 20% e um volume de negócios que atingiu valores a rondar os 75 milhões de euros.
Em entrevista à PME Magazine, Paulo Rebelo, presidente da Bluepharma, faz o balanço dos primeiros 20 anos da empresa, mostrando-se confiante para o futuro, mas focado no presente que passa pelo desenvolvimento comercial e científico.
PME Magazine – Que balanço faz dos primeiros 20 anos da empresa?
Paulo Rebelo (P. R.) – O balanço que faço destes primeiros 20 anos é extremamente positivo porque sentimos que a nossa missão, há 20 anos, foi totalmente cumprida. Essa missão foi trazer ao mercado medicamentos de qualidade a custos acessíveis aos doentes portugueses, colaborar com o Estado na redução da despesa pública e fazermos medicamentos para fora do país, portanto, exportar. Depois, tivemos alguns objetivos colaterais, que, no caso de as coisas correrem bem, passariam pelo investimento em investigação e desenvolvimento, e, portanto, criaríamos um círculo virtuoso, através do qual, partindo dos medicamentos genéricos chegaríamos aos medicamentos inovadores.
PME Mag. – Quais os objetivos desenvolvidos até aqui?
(P. R.) – Durante estes 20 anos, ajudámos na democratização do consumo de medicamentos no mundo. Hoje, exportamos para cerca de 40 países dos cinco continentes, criando valor e mão de obra muito qualificada no nosso país. Conseguimos que o Estado poupasse muito dinheiro: na indústria farmacêutica, há 10 anos que o Estado poupa mil milhões de euros em medicamentos, com esta política de implementar os medicamentos genéricos em Portugal. Aliás, à semelhança do que já faziam países mais ricos e desenvolvidos. Fazemos parte desta transformação que Portugal fez no setor de medicamentos, e sentimo-nos felizes por termos ajudado a democratizar o consumo, colaborado com o Estado para reduzir a despesa pública e por termos um importante papel no equilíbrio da balança comercial dos medicamentos, porque evitamos importações e exportamos com alguma intensidade: 87% dos nossos produtos são exportados para cerca de 40 países. Em termos de investigação, temos colaborado com várias empresas. Lançámos, até aqui, dez startups. Uma delas, a Luzitin, tem feito desenvolvimentos na área do cancro, onde temos um medicamento muito interessante que está em fase de ensaios clínicos. O desenvolvimento deste medicamento está a ser feito através de um composto químico que quando iluminado com uma luz, com um determinado comprimento de onda, liberta um oxigénio muito reativo que mata as células onde ele está acumulado, neste caso, as células oncológicas.
Durantes estes 20 anos, ajudámos na democratização do consumo de medicamentos no mundo.
PME Mag. – De que forma a atual situação pandémica veio alterar os planos/projetos da Bluepharma? Como explica o crescimento positivo da empresa?
(P. R.) – Esta situação, e outras, não alteraram o nosso rumo. Nós temos pensado sempre o projeto a longo prazo e temos sempre metas a atingir com prazos de dez anos. Portanto, quando definimos essas metas, seguimos o plano, não são estas coisas que nos fazem alterá-lo. A primeira década foi de reestruturação e desenvolvimento da empresa . A segunda década foi de consolidação do desenvolvimento anterior: consolidámos toda a parte de investigação, onde hoje trabalham 130 cientistas no nosso centro de I&D, e consolidámos a nossa rede internacional de clientes. Portanto, de um lado, a ciência, do outro lado, a área comercial. Foi assim que trabalhámos, criando um conjunto de empresas: em 20 anos, criámos 20 empresas. Nesta terceira década que agora se inicia, estamos a começar com investimentos enormes. Estamos a terminar um último investimento de cerca de 48 milhões de euros, destinado a duas unidades industriais. Uma delas, completamente nova, é dedicada a medicamentos de alta atividade terapêutica muito vocacionada para o cancro. E a outra é a empresa que temos neste momento e estamos a reestruturá-la, a aumentar a capacidade e a digitalizar muitos procedimentos.
PME Mag. – Com o anunciado investimento de 200 milhões de euros, que projetos podemos esperar por parte da Bluepharma? Que expetativas tem para o futuro?
(P. R.) – Estamos numa lógica de indústria 4.0, a fazer um investimento muito forte em sistemas de informação sofisticados e em otimizar e simplificar um conjunto de processos. Três palavras-chave para nós são a simplificação, a otimização e a cooperação. Os próximos dez anos serão dedicados ao funcionamento das duas unidades industriais e temos ainda um projeto que é o Bluepharma Park, um projeto a 10 anos, em que pretendemos atrair parceiros estratégicos na área do medicamento. Temos também projetos próprios, nomeadamente uma fábrica de injetáveis complexos que pretendemos construir nessas instalações. São instalações de uma empresa que fechou há muitos anos, com dimensão para o que queremos fazer – cerca de 35 mil metros cobertos – e que vai permitir construir as nossas unidades e disponibilizar espaço para outros parceiros que queiram estar connosco no Bluepharma Park, proporcionando um conjunto de serviços dos quais, hoje, já temos conhecimento. Por exemplo, a área de qualidade da farmacovigilância, a área financeira, a área de relações com os clientes. Serão dez anos destinados a investir e a transformar a face da Bluepharma, com o Bluepharma Acelera 2030, que é o projeto que referi de 48 milhões de investimento, que vamos terminar no final deste ano. Depois, para o Bluepharma Park, estimamos um investimento de 150 milhões.
Três palavras-chave para nós são a simplificação, a otimização e a cooperação.
PME Mag. – Que projetos futuros, além dos referidos e anunciados, podemos esperar da Bluepharma num futuro próximo? Há algum desenvolvimento neste sentido?
(P. R.) – Esta fábrica de injetáveis complexos que pretendemos levar a cabo poderá, se o mercado assim o ditar, vir a ser convertida no desenvolvimento de vacinas, para evoluirmos também nessa área. Não quero deixar falsas expetativas, porque isto é um processo que irá levar anos: projetar uma fábrica, licenciá-la, construí-la e tê-la a fabricar é um processo que nunca levará menos de quatro anos. Mas estamos preparados, a evoluir, temos know-how, temos as pessoas e temos esse projeto que já está em andamento. Iniciámo-lo há cinco anos, ou seja, é um projeto que não está relacionado com a pandemia nem com o processo de vacinação. Já licenciámos dois desses complexos injetáveis nos EUA e essa fábrica irá seguir este caminho que temos planeado, mas poderá ficar preparada para poder vir a produzir vacinas.
Estamos a evoluir, temos know-how, pessoas e um projeto em andamento.
PME Mag. – Que planos, ao nível da internacionalização da empresa, estão em desenvolvimento? Como está a ser feito esse processo?
(P. R.) – O mercado norte-americano é o mercado que sentimos que vai crescer mais nos próximos anos. Nós exportamos 87% da nossa produção, principalmente para a Europa e Estados Unidos, embora o façamos também para a América Latina, Médio Oriente, Ásia e Austrália. Mas pensamos que, no futuro, será através dos EUA que vamos crescer mais.
PME Mag. – O que distingue a Bluepharma de outras empresas do setor farmacêutico?
(P. R.) – A distinção é pela equipa: temos uma equipa magnifica. Temos flexibilidade e temos um foco enorme no cliente. O cliente para nós é quem manda. A Bluepharma não é da administração, nem dos colaboradores: é dos clientes. Tentamos trabalhar com o máximo de transparência porque só assim se criam relações de confiança e só dessa forma conseguimos ter clientes e fazer negócios. Essas são as nossas premissas.
A Bluepharma não é da administração nem dos colaboradores: é dos clientes.
PME Mag. – Em Portugal, quantos colaboradores estão atualmente envolvidos na empresa? Têm previsto contratações?
(P. R.) – Nós estamos com 750 pessoas a trabalhar e começámos com 58, o que é algo assinalável em 20 anos. E estamos muito atentos ao que se está a passar no mercado e disponíveis para estudar possíveis aquisições de outras empresas. Temos o plano de investimento nesta estrutura e estamos atentos a outras oportunidades que possam surgir. Em termos de Business Plan, para este ano, temos previstas 100 contratações, o que tem a ver com a nova unidade industrial que queremos abrir para o ano e, portanto, temos que preparar as equipas já em 2021.