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Madalena Cascais Tomé alteração abrupta
Madalena Cascais Tomé é CEO da SIBS desde final de 2015 (Foto: João Filipe Aguiar)

“Houve uma alteração abrupta nos hábitos de vida das pessoas” – Madalena Cascais Tomé

Por: Ana Rita Justo

Foto: João Filipe Aguiar

Com mais de 10 milhões de transações por dia, a SIBS aposta num futuro em que os pagamentos são cada vez mais invisíveis e em ajudar as empresas a melhorar ainda mais a experiência que dão aos seus consumidores. Uma entrevista que, na verdade, foram duas à CEO da SIBS, Madalena Cascais Tomé – a primeira quando ainda não se adivinhava a pandemia e a segunda já de olhos postos na retoma.

PME Magazine – De que forma é que as soluções cashless da SIBS têm ajudado as empresas a reinventar-se?

Madalena Cascais Tomé – Desde logo, o passarmos para pagamentos eletrónicos e toda esta lógica de digitalização é algo que aporta muita eficiência às empresas. Acreditamos que é por via dessa eletronização e dessa digitalização que, quer as empresas, quer também os utilizadores conseguem ter mais tempo para aquilo que é mais importante, para se focarem nas suas atividades, nos seus processos produtivos. Cada vez mais, não só as soluções mais tradicionais, como os chamados POS [n. d. r. point of sale, em português, ponto de venda], a aceitação física de pagamentos, que tem tido uma aceleração muito importante nos últimos anos, tem estado a crescer a um ritmo superior do ritmo da economia e contribui para que todos os processos de compra, de check-out, possam ser muito agilizados. No fundo, o que os negócios querem é vender, o que as pessoas querem é comprar e o pagamento acaba por ter de ser o mais invisível possível, o mais digital possível. Temos também trabalhado muitíssimo naquilo que é trazer toda esta realidade para o online. Acreditamos que, sobretudo para o tecido empresarial português, para as PME, o e-commerce é uma enorme oportunidade, porque é passar do mercado português, que é relativamente mais contido, para o mercado que tem uma escala global… Temos muitos exemplos disso já em Portugal e as nossas soluções de pagamentos digitais para o e-commerce têm feito esse contributo. A forma como vemos isto é muito empenhada, muito ativa e que também acreditamos que vai muito além daquilo que é tecnologia. Além das soluções tecnológicas, fazemos um trabalho muito ativo no terreno com as empresas. Estamos, por exemplo, presentes na Iniciativa do Comércio Digital, em que temos estado a fazer um roadshow por todo o país, no fundo, para trazer estas soluções e muita desta aprendizagem para as nossas PME e para os nossos empresários para garantir que toda esta componente do pagamento e da presença online fica muito facilitada. Queremos, de facto, ter este papel e este contributo muito ativo para garantir que a nossa economia é cada vez mais digital e que as nossas empresas são cada vez mais produtivas e eficientes, porque acreditamos que esse é o caminho no futuro.

“Acreditamos que, sobretudo para o tecido empresarial português, para as PME, o e-commerce é uma enorme oportunidade”

PME Mag. – Pode destacar algum caso em concreto?

M. C. T. – Isso seria, porventura, injusto. O que é importante é, cada vez mais, haver esta dinâmica muito mais alargada. Sabemos que, no nosso tecido empresarial, mais de cerca de metade das empresas são microempresas e, portanto, fazer com que todas estas microempresas consigam dar esse salto é o que vai dinamizar a nossa economia. Posso referir-lhe alguns números: como disse, as compras eletrónicas estão a crescer acima do valor da economia – têm crescido cerca de 10% ao ano; as compras no comércio digital têm crescido cerca de 40% ao ano. Vê-se bem esta dinâmica e esta evolução que tem acontecido para o digital. Acho que também é importante reforçar que as nossas soluções, muitas vezes, vão além disso. Por exemplo, temos áreas, que são menos conhecidas, como a produção de cartões, em que também aí estamos a apoiar e a desenvolver soluções inovadoras, como os cartões de fidelização. Ou seja, cada vez mais garantindo que estas empresas conseguem ter ferramentas de diferenciação no seu posicionamento no mercado.

PME Mag. – Conseguiram tornar o Web Summit cashless, que outros exemplos como este pode dar?

M. C. T. – Uma das áreas que tem sido muito interessante trabalhar tem sido toda a lógica dos festivais e dos eventos. De facto, é uma área em que cada vez mais as pessoas querem estar descontraídas a usufruir da experiência. Ter esta lógica cashless tem sido muito importante. Temos trabalhado com diversas organizações, desde festivais de música, até feiras mais regionais e locais no sentido de garantir que durante o evento as pessoas não têm de manusear cash, têm, sim, de usufruir da experiência, fazer cada vez mais o seu convívio e a utilização, quer da parte mais de food and beverages [comida e bebida], quer também de outras áreas de merchandising que possam utilizar. Temos algo que é muito interessante que é um beer point, para utilizar ou para beber uma cerveja, ou, por exemplo, tirar um café – cada vez mais podemos fazê-lo só com o nosso telemóvel, não precisamos de ter toda a logística de ter moedas, que é sempre um grande inconveniente. E começamos também a trabalhar naquilo que eu acredito que é o futuro dos pagamentos que são os pagamentos invisíveis. Todas as experiências que existem lá fora, nós já estamos também a pilotar com algumas entidades em Portugal no sentido de garantir que, mesmo em retalhistas, grandes superfícies, pontos de venda, é cada vez mais possível fazer a compra sem ter de fazer o pagamento e, portanto, cada vez mais o futuro será a invisibilidade do pagamento, porque as pessoas querem comprar, não querem pagar.

“Segurança primeiro”

PME Mag. – A segurança é muito importante neste tipo de pagamentos. É assim que surge o serviço antifraude Paywatch?

M. C. T. – Sim, toda a filosofia da SIBS é uma filosofia “Security by Design”, todas as nossas soluções – e isso é algo que nos caracteriza e nos diferencia e que tem contribuído para termos os níveis de segurança que temos, que são destacados a nível europeu – é que todas as soluções que fazemos começam e pensam na segurança em primeiro plano. Todo o paradigma de pagamento está a passar de uma lógica de autorização para uma lógica de autenticação. Eu não autorizo a transação, eu mostro que sou e isso permite-me fazer um conjunto de operações e um conjunto de pagamentos. Não só do ponto de vista do Paywatch, dos serviços antifraude que temos 24 sobre 7 e que estão em permanência a olhar para todo o ecossistema de pagamentos em Portugal e nos mercados onde estamos presentes para atuar sobre esse tema, mas também todas as soluções tecnológicas caminham cada vez mais para uma autenticação a que chamamos forte, muito assente em biometria, muito assente em conceitos de tokenização, para que se atue, não só no início do pagamento, com a tal autenticação, mas depois durante todo o processo, e aí, sim, entram também os processos da Paywatch e toda esta vigilância que fazemos 24 sobre 7 e toda esta atuação que fazemos em permanência de forma invisível e que está lá todo o tempo.

PME Mag. – Que balanço faz do programa SIBS Payforward?

M. C. T. – Tem sido extremamente positivo e aqui se calhar destacaria duas vertentes, desde logo o ecossistema e a dinamização de soluções novas e, de facto, têm surgido imensas ideias interessantes. Ao longo das três edições do programa, tivemos mais de 150 startups a participar, muitas delas internacionais, mais de 70% destas startups são internacionais e isso tem alimentado uma dinâmica de soluções e de conceitos, de provas e de experiências muito interessante. Mas, também, o próprio trabalho em conjunto da equipa da SIBS com estas equipas de startups que têm, muitas vezes, uma dinâmica diferente. Tem sido muito enriquecedor, quer da nossa perspetiva, quer na perspetiva destas startups. Edição após edição, temos tido cada vez mais candidaturas e uma das coisas que tem sido realçada pelas startups participantes tem sido a enorme aprendizagem que têm tido com as pessoas da SIBS e a enorme partilha de experiências. Isto tem gerado um networking muito interessante, que até subsiste após a edição do programa. Tem sido, de facto, muito, muito interessante.

PME Mag. – Quantas empresas já beneficiam dos instant payments?

M. C. T. – Neste momento – e isso é algo que vale a pena destacar no mercado português – temos uma percentagem de cobertura de instant payments quase próxima dos 100% das contas empresariais. É algo bastante único no contexto europeu. A plataforma de instant payments que foi desenvolvida pela SIBS tem uma abrangência enorme. Estamos, neste momento, a operar na interoperabilidade desta mesma plataforma para chegar aos outros mercados, mas tem tido uma abrangência única, ímpar no contexto europeu. Quer do ponto de vista de instant payments, quer do ponto de vista de open banking, temos sido pioneiros na forma como introduzimos estas soluções no mercado e na abrangência que estas soluções têm.

“Temos uma cobertura de instant payments quase próxima dos 100% das contas empresariais”

PME Mag. – Que papel tem o SIBS Analytics na perceção dos hábitos de consumo dos portugueses?

M. C. T. – Desde logo, é uma ferramenta útil em diversas dimensões, é muito uma aprendizagem de utilização. Foi essa, também, a nossa visão, ao lançar o SIBS Analytics, pôr no mercado e disponível, quer para as PME, empresas de várias dimensões, quer também para a academia, um conjunto de dados que são importantes para caracterizar a nossa economia e a nossa atividade económica. Tem sido um crescendo de procura nessa matéria. Também temos apoiado as empresas nalgumas análises mais específicas relativas ao seu setor e relativas à sua própria atividade, mas, na prática, o que eu aconselharia ou recomendaria é muito uma lógica de teste e de experimentação, porque a informação é muito rica e pode ser muito útil para as empresas, sobretudo para se situarem no seu setor de atividade, naquilo que, no fundo, tem sido o perfil de utilização entre nacionais e estrangeiros. Há uma panorâmica muito interessante, com uma atualidade muito grande sobre estes dados, porque, na prática, os dados estão disponíveis relativamente ao mês anterior e isso é uma atualidade muito importante para se perceber, de forma muito rápida, como é que estão a evoluir os principais indicadores de consumo.

“Adaptação é fundamental”

PME Mag. – O que é que as empresas precisam de ter em conta hoje para vingarem?

M. C. T. – Diria que a tecnologia – e essa é a grande revolução, o grande contexto de revolução que vivemos é muito rápido, muito acessível, muito dinâmico. Portanto, a capacidade de adaptação é fundamental. Os temas de tecnologia são, obviamente, muito importantes e, hoje, a tecnologia está disponível de uma forma muito acessível, muito fácil. E depois, toda esta capacidade de adaptação. Quer, por um lado, garantir a eficiência, isso é o fundamental para a competição e para a competitividade da empresa, mas também, sobretudo, apostar nos seus fatores de diferenciação que são cada vez mais importantes.

PME Mag. – Qual a previsão de transações para 2020?

M. C. T. – Nós terminámos o ano de 2019 com 3,8 mil milhões de transações, só para ter uma ideia isto representa cerca de 10 milhões de transações por dia, quando em 2018 tínhamos tido 8,9. Portanto, na prática, temos mais um milhão de transações por dia, o que significa um crescimento de cerca de 10%. Como lhe dizia, esta digitalização manifesta-se e está a manifestar-se também nestes indicadores. Acreditamos que esta tendência de crescimento se vai manter. Aqui também é muito importante a nossa presença nos mercados internacionais e também destacaria a presença na Polónia, em que estamos com um crescimento ainda mais acelerado, porque há uma lógica de incentivos públicos à digitalização, nomeadamente através da constituição daquilo que é o fundo chassless e aí os nossos crescimentos estão a ser acelerados, na ordem dos 40%. É, de facto, um mercado onde o crescimento ainda será mais acelerado, mais dinâmico e onde, até por via da aquisição que fizemos de um player polaco estamos no top 3 do crescimento no mercado. Estamos a dar um contributo muito importante para este crescimento e para esta digitalização.

PME Mag. – Qual é exatamente a estratégia de internacionalização da SIBS?

M. C. T. – A nossa aposta é crescer nos mercados em que estamos presentes e sedimentar essa posição aí e, com esse entorno, continuar a crescer no contexto europeu, porque estamos num mercado altamente dinâmico e competitivo, de crescimento acelerado. A SIBS é um dos top players europeus de pagamentos e queremos, por via também deste crescimento, manter-nos nessa posição de liderança no contexto europeu. No mercado da Polónia, continuamos com este crescimento orgânico acelerado, na ordem dos 40%, como lhe referi, e também continuamos ativamente à procura de outras oportunidades de crescimento inorgânico. Nos mercados em vias de desenvolvimento em que estamos presentes, nomeadamente nos mercados africanos, continuamos a fazer uma aposta também muito grande no desenvolvimento dessas economias. No último ano, processaram, através das nossas soluções, através da nossa tecnologia, cerca de dois mil milhões de transações. Mercados que, quando nós começámos a trabalhar, eram muito incipientes do ponto de vista de aceitação eletrónica, e estamos também a levar para estes mercados toda a lógica das wallets digitais e dos pagamentos móveis, aí também dando um contributo muito importante para essa digitalização e também, por esta via de internacionalização, queremos continuar a levar a tecnologia portuguesa e a mostrar a tecnologia portuguesa, que é distintiva e no caso dos pagamentos é muitíssimo distintiva no contexto europeu.

“MB Way facilitou os pequenos pagamentos”

PME Mag. – De que forma o MB Way alterou os hábitos de consumo dos portugueses?

M. C. T. – O MB Way, uma das coisas que tem facilitado são os pequenos pagamentos. Cerca de 60% das transferências são abaixo dos 20 euros, que tipicamente eram transferências que se calhar eram feitas em dinheiro e, isso sim, é um indicador muito positivo, mais uma vez, desta alteração de comportamentos para uma lógica muito mais digital. Temos cerca de 1,2 milhões de compras físicas por mês com o MB Way*, o que significa que há uma alteração de hábito, há pessoas que já não utilizam a carteira no seu dia-a-dia, que apenas com o seu telemóvel conseguem fazer a maior parte da sua utilização, incluindo as compras físicas. Utilizar também o multibanco, que hoje é possível só com o telemóvel fazer todas as operações. No final do ano, quisemos também trazer o “Ser Solidário” para o MB Way, porque acreditamos que a tecnologia só faz sentido se puder estar ao serviço das pessoas e da comunidade. Queremos tambémcontinuar a apoiar e a facilitar os pequenos donativos para as instituições que fazem parte deste serviço.

PME Mag. – Para quando a internacionalização do MB Way?

M. C. T. – Anunciámos, no ano passado, que somos pioneiros e somos membros fundadores de uma associação internacional de pagamentos e de soluções de pagamentos digitais. Portanto, é um caminho que estamos a fazer por essa via e é algo em que estamos a trabalhar. Este ano já, por exemplo, tivemos a inclusão dos números internacionais no MB Way, o que já é um passo nesse sentido, complementando a nossa base de utilizadores e possibilitando que, cada vez mais, os estrangeiros que estão em Portugal, ou os portugueses que estão no estrangeiro com um número internacional possam também utilizar o serviço. Eu diria que para breve…

PME Mag. –A SIBS vence o Melhor Projeto de Transformação Digital 2019. Como é que se chega até aqui?

M. C. T. – É um enorme orgulho, sobretudo em nome desta equipa, recebermos 11 prémios de sete entidades diferentes, desde júris constituídos por personalidades até eleições dos utilizadores. Acho que tem sido um enorme trabalho em equipa. Lá está, nessa diversidade entre a SIBS mais tradicional, ou as competências core que tínhamos, e depois todas estas novas competências que também tivemos de trazer e com as quais tivemos de completar a equipa, nomeadamente todas as lógicas de inteligência artificial, de analytics, de digitalização, com muito foco e com muito esforço, com muito empenho, porque já vínhamos de uma realidade com enorme inovação. Quer dizer, tínhamos produtos, como o MB Net, que foram lançados para o online há 18 anos e sobre isso também continuamos a inovar, muitas vezes, não só no lançamento de novos produtos, mas no fundo reconfigurando produtos que já tínhamos, sempre com uma enorme consciência de se fazer muito bem o nosso core, porque na prática processamos os tais 3,8 mil milhões de transações a todo o momento e isso é algo que exige uma grande responsabilidade e uma grande atenção, mas conseguindo lançar estas novas soluções com uma enorme persistência e também com muita atenção à forma como podemos ter impacto na vida das pessoas, como é que estas soluções tecnológicas vão além da tecnologia e conseguem trazer valor, libertar tempo, trazer conveniência no dia-a-dia das pessoas. É o exemplo do MB Way, é o exemplo da SIBS Analytics, é o exemplo dos Instant Payments no caso das empresas, tem sido muito essa a lógica, tem sido muito esse o foco.

PME Mag. – Se acontecesse uma crise como a de 2008 a SIBS estaria preparada para a enfrentar?

M. C. T. – Sim, sem dúvida.

PME Mag. – Como vê a SIBS daqui a cinco anos?

M. C. T. – Desde logo, espero lançarmos nos próximos cinco anos os mesmos 60 novos produtos que lançámos agora. Continuo a ver a SIBS com esta dinâmica de inovação enorme, com este contributo muito ativo naquilo que é a digitalização dos pagamentos em Portugal, com este empenho também em ser uma bandeira da tecnologia portuguesa nos mercados onde estamos presentes, a continuar a ser um player relevante no contexto europeu, com o crescimento desta grande equipa. Hoje, somos quase cerca de mil pessoas e acho que temos de crescer não só em dimensão, mas sobretudo em talentos, em desenvolver os talentos que temos dentro de casa. E a contribuir para que os pagamentos sejam cada vez mais invisíveis, para que o sistema de pagamentos nacional continue a ser uma referência a nível internacional e para que cada vez mais as pessoas possam ter apenas o seu smartphone ou o device que escolham para fazer os seus pagamentos – aliás, para comprar, que se esqueçam quase da componente do pagamento.

PME Mag. – Como concilia a sua vida pessoal e profissional?

M. C. T. – Como em tudo, é um tema de organização. Temos de fazer as nossas escolhas, essa é a primeira questão que é preciso ter presente. É algo que sempre fiz ao longo da minha carreira e, obviamente, é algo que também é muito enriquecedor, porque a componente pessoal é uma inspiração grande para aquilo que fazemos e que trazemos no dia-a-dia na nossa vida profissional e vice-versa.

A SIBS NA ERA PÓS-COVID

PME Mag. – Desde que foi decretado o confinamento, o que é que mudou?

M. C. T. – O mundo mudou muito, não só na SIBS, mas em geral. Todos nós estamos a viver uma época sem precedentes, a forma como trabalhamos, como convivemos, como nos entretemos está a mudar completamente. A SIBS, até antes da declaração do estado de emergência, acionou um plano de contingência – tínhamos já um plano de continuidade de negócio bastante exaustivo, fruto do que é a nossa atividade como infraestrutura e como empresa tecnológica de referência. Ativámos o plano de contingência e estamos, maioritariamente, em teletrabalho, sendo que as equipas críticas estão ainda no local. Agora, o que verdadeiramente mudou são também os desafios que se colocam à nossa atividade, acelerando aquilo que era uma tendência que já vinha de trás que é a crescente digitalização e eletronização dos pagamentos. Se há algo que é marcante neste momento, é uma alteração abrupta naquilo que são os hábitos das pessoas em todas as suas dimensões, mas também na forma como compram, pagam, como, no fundo, satisfazem as suas necessidades do dia-a-dia. Isto, se alguma coisa vem trazer à SIBS é acelerar os seus desafios de digitalização e também demonstrar a importância de uma empresa tecnológica portuguesa, de base portuguesa. Porque também se há algo que este momento trouxe de novo, além dos hábitos das pessoas, das empresas, é uma descontinuidade naquilo que era um processo de globalização. Cada vez mais – e este momento vem mostrar isto – é muito importante a capacidade de autonomia dos países e dos mercados nas suas infraestruturas críticas e, obviamente, a infraestrutura de pagamentos e a atividade e a tecnologia que a SIBS disponibiliza são críticos e temos tido o foco de estar à altura de responder a este desafio, contribuindo de forma muito ativa em tudo aquilo que são as nossas áreas de intervenção para minimizar o impacto que esta pandemia está a ter na vida dos portugueses, das empresas e dos indivíduos e contribuir também de forma ativa para mitigar a sua propagação, nomeadamente através das soluções digitais que disponibilizamos.

PME Mag. – Quantos trabalhadores têm em teletrabalho e presencialmente?
M. C. T. –
Temos cerca de 700 trabalhadores em teletrabalho e cerca de 300 que estão on premises, mas obviamente também a trabalhar de uma forma diferente. Todas as equipas que estão de forma incansável a assegurar estas infraestruturas críticas e que precisam de o fazer no local estão a trabalhar numa lógica de espelho e em turnos não simultâneos, também tirando partido das nossas infraestruturas segregadas, exatamente para assegurar o máximo de resiliência e para estarmos, como sempre, em permanência, 24 sobre 7. A SIBS é uma empresa, nessa medida, resiliente. A nossa preocupação é, desde logo, a saúde dos nossos que é a sua atividade e o trabalho desses nossos colaboradores, mas também do ponto de vista daquilo e obviamente o foco operacional. A SIBS é uma empresa robusta, a sua atividade também tem sido impactada, mas temos, ainda assim, um nível de atividade que nos permitiu não recorrer ao lay-off.

PME Mag. – De que forma é que esta pandemia impactou o negócio da SIBS?

M. C. T. – Acho que separaria aqui em vários momentos: é óbvio que a atividade da SIBS, sendo tão central no dia-a-dia dos portugueses e das pessoas, está a ser impactada naquilo que é esta grande alteração de hábitos de consumo. Num primeiro momento, quando foi declarado o estado de emergência, houve uma alteração bastante dramática e um impacto significativo na principal atividade da SIBS, fruto também do confinamento que foi decretado com esse estado de emergência. Aí, fruto desse confinamento e da alteração dos hábitos de consumo dos portugueses, tivemos um impacto bastante significativo na atividade. Estamos a divulgar semanalmente os números também relacionados com os indicadores de consumo, através do SIBS Analytics e isso foi bastante visível. A frequência com que os portugueses compravam decresceu em 50% e isso também se traduz na nossa atividade. Mais recentemente, nesta etapa de desconfinamento, tem-se verificado já uma recuperação desta atividade, ainda que estejamos com uma quebra de cerca de 30% na atividade de compra. Também há aqui um efeito positivo de estímulo à nossa atividade, até mais do ponto de vista de inovação e de desenvolvimento, que é o facto de, ao mesmo tempo que se assiste a esta tendência e a este decréscimo de frequência de compras, há uma aceleração significativa da digitalização e uma adoção crescente dos meios de pagamento eletrónicos. Nesse contexto, é com bastante orgulho que contribuímos com o MB Way, que é das formas de pagar mais recomendadas no contexto desta pandemia, porque é uma forma de pagamento sem contacto. O MB Way tem, neste momento, mais de 2,4 milhões de utilizadores e cerca de sete milhões de transações por mês e tem crescido significativamente no contexto desta pandemia. Também do lado da transformação e da nossa atividade mais perto dos nossos parceiros e mais perto das empresas, o que se assiste é a uma maior digitalização nessa perspetiva. Vemos que houve setores que foram muitíssimo impactados neste contexto de confinamento, houve uma concentração grande de consumo dos portugueses nos setores mais essenciais – o retalho alimentar, os supermercados, os hipermercados, as mercearias, as farmácias e as parafarmácias, que passaram a ter um peso de cerca de duas em cada três compras dos portugueses. Começa-se já a ver alguma dispersão e a retoma de alguns outros setores, mas, sobretudo, o que se assistiu foi também do lado das empresas a uma transformação grande para os métodos e os modelos não presenciais, para o e-commerce e, também nessa medida, a SIBS, através das suas soluções digitais, está a ter um crescimento, uma aceleração na adoção dessas soluções, podendo contribuir para a transição destas empresas para o digital, que neste contexto tiveram de o fazer de forma bastante mais acelerada e mais abrupta. Obviamente, os impactos são, no conjunto da atividade, em termos de volume, negativos, mas os novos desafios que trouxeram estão, por outro lado, a ser um estímulo para desenvolver todas as áreas de digitalização que são agora a nossa grande aposta de inovação e também outras áreas em que queremos contribuir do ponto de vista da solidariedade e de impacto para a sociedade. Posso referir que a nossa fábrica de cartões está a produzir viseiras – há aqui também a alteração de algumas atividades no sentido de podermos contribuir para aquilo que este momento exige.

PME Mag. – Que medidas tomaram para fazerem a retoma em segurança?

M. C. T. – Desde logo, as formas de trabalhar vão adaptar-se de uma forma absolutamente nova. Esta retoma será feita de uma forma progressiva, mas também é verdade que estas várias semanas que estivemos em teletrabalho, ou que uma grande parte das nossas equipas estiveram em teletrabalho estão a fazer-nos repensar algumas das formas como trabalhamos e com que nos organizamos, sobretudo entre as equipas em várias geografias. Estamos a preparar o regresso dessas equipas que estão em teletrabalho, vamos fazê-lo de uma forma faseada, seguindo as recomendações das autoridades de saúde, fortalecendo e reforçando as medidas de higienização e também de prevenção e de educação dessa higienização, todos os cuidados de monitoria térmica e de saúde que terão de ser feitos, garantir o escalonamento das equipas… Vamos continuar a fazer este regresso de uma forma faseada, por turnos não simultâneos e garantindo que há os devidos cuidados e ressalvas do trabalho em espelho nas atividades críticas. Estamos, inclusivamente, a duplicar as instalações das nossas equipas críticas, também para reforçar essa simultaneidade e, no fundo, estas são as principais medidas, sempre a par e passo com aquilo que são as recomendações das autoridades de saúde.

PME Mag. – E agora, como vê o futuro da SIBS?

M. C. T. – A grande incógnita não será o futuro da SIBS, mas como é que será a retoma da nossa economia. Há várias versões, algumas até equiparadas com letras, acho que todos já temos a consciência de que isto não será uma recuperação em V, não é uma crise com recuperação rápida. A nossa grande questão é se isto será uma recuperação mais em U, uma recuperação mais rápida, ou mais em L, mais progressiva, ou eventualmente se não teremos aqui uma recidiva e um novo surto deste vírus e isso provavelmente seria o cenário mais dramático – não para a SIBS, mas para a economia como um todo. Independentemente deste contexto, há algo que é muito promissor na nossa atividade: o facto de estarmos nesta crescente digitalização é uma transformação sem precedentes, mas é uma transformação que, tendo sido acelerada por um evento conjuntural terá, com certeza, um impacto estrutural. Portanto, acreditamos e vamos continuar a contribuir de forma bastante ativa para a digitalização dos portugueses e também dos outros mercados em que estamos presentes. Estamos a continuar as nossas atividades de investimento e de investigação e desenvolvimento exatamente nesse sentido. Portanto, o futuro para a SIBS será promissor, obviamente empenhado em poder acompanhar, apoiar e contribuir para a recuperação da economia, dos agentes económicos, dos indivíduos, porque também assumimos como nossa essa missão, conseguindo introduzir formas de pagamento que acabam por ser uma interação social tão importante neste contexto, eficientes, convenientes, seguras e práticas. Também é importante reforçar que todo o paradigma de processos produtivos está a ser alterado e está a vir ao de cima também a importância das atividades locais e o foco dessas atividades, porque estamos a ter uma reformulação gigantesca nos processos produtivos e nas dependências que existiam entre o país e entre os mercados.

Veja o vídeo da entrevista:

Vídeo: NortFilmes

*NOTAS: a primeira entrevista realizou-se a 15 de janeiro de 2020 e a última
a 22 de maio de 2020. Dados de compras físicas com MB Way atualizados
segundo a entrevista de 22 de maio de 2020