Por: Ana Rita Justo
Olga Kassian tinha quatro anos quando se mudou de Lviv, na Ucrânia, para Portugal, onde cresceu. Há um ano criou a Wonther, marca de joalharia feita a partir de matéria-prima reciclada e que tem como objetivo inspirar todas as mulheres.
Era uma vez uma estudante de Engenharia e Gestão Industrial que, afinal, queria criar uma marca de joias sustentáveis. A história não é tão simples, mas foi a base para a criação da Wonther.
Olga Kassian nasceu em Lviv, na Ucrânia, e com apenas quatro anos rumou a Portugal com os pais, que procuravam uma vida mais estável. Começou por viver em São João da Madeira e depois em Santa Maria da Feira. Fez dois anos do curso de Engenharia e Gestão Industrial, até que um dia, através da Associação de Engenharia e Gestão Industrial de Aveiro, fez um pitch que mudou a sua vida.
“Participei num pitch e conheci a CEO da Josefinas [n. d. r. Maria Cunha]. Ela gostou de mim e perguntou-me se eu queria ir para Nova Iorque. Eu disse logo que sim, nem pensei”, conta Olga à PME Magazine. A oportunidade de trabalhar na loja da marca portuguesa de sapatos Josefinas levou Olga viver em Nova Iorque durante um ano, quando tinha apenas 19 anos de idade.
Ao regressar a Portugal, ainda voltou ao curso, mas percebeu que não seria aquele o seu futuro: “Não queria ser engenheira, gostava era de gerir projetos, gerir pessoas e negócios e fiquei-me pela licenciatura. Como acho que as pessoas devem agarrar as oportunidades e depois, andando, descobrimos como se faz, foi um bocadinho assim que nasceu a Wonther”.
A ideia era criar uma marca de joalharia que fosse eticamente responsável, que personificasse a ambição das mulheres e que cada peça tivesse um significado único.
“Uma joia tem sempre um significado, pode passar de geração em geração. Eu quando ia comprar joias sentia sempre um peso muito grande de ter de escolher a peça certa, não era só mais um acessório”, justifica a empreendedora.
O projeto nasce, oficialmente, no final de 2019.
Joias ‘responsáveis’ como?
Quais os critérios que a Wonther teve, então, de seguir para produzir peças sustentáveis? Em primeiro lugar, procurar uma fábrica cuja produção respeitasse os princípios do Conselho de Joalharia Responsável (RJC, sigla em inglês), uma organização sem fins lucrativos, cuja missão é promover práticas ambientais e sociais com ética e responsabilidade e de respeito pelos direitos humanos na cadeia de fornecimento da indústria de joias de ouro e de diamantes.
Em Portugal, explica Olga Kassian, há apenas uma fábrica certificada pelo RJC [ver caixa] para este efeito, sendo neste momento nela que se produzem as joias da Wonther.
“Esta organização tem uma série de parâmetros que garantem que as origens dos materiais vêm de locais que não estão em conflito, onde os direitos dos trabalhadores são respeitados, que têm formas éticas de trabalho, que estão dentro do enquadramento legal, que têm um impacto ambiental o mais reduzido possível… Isso garante que o nosso ouro e a nossa prata são verdes e de origem reciclada”, enfatiza.
Um produto “diferente”
Com a maioria das compras a ser feita online, a Wonther aposta ainda num posicionamento diferenciador com peças à venda na The Yeatman Wine Shop, no hotel The Yeatman, no Porto.
Com o design das peças a cargo da designer Rita Botelho, Olga sinaliza o feedback positivo por parte de quem conhece a marca: “Acham, essencialmente, que o produto é diferente, que o design é original e gostam muito da emoção conotada nas peças”.
Emoção essa ligada à ambição e ao sucesso no feminino.
“A nossa definição de ambição vai além daquilo que é o sucesso profissional. Para nós, o sucesso não é só estar no topo da empresa, ou criar uma empresa. O sucesso pode ser ter filhos, casar, descansar e dormir e cuidarmos de nós próprios. Todas as nossas joias têm um simbolismo e a ideia é, quando uma mulher tiver aquela peça, que seja um lembrete: ‘Eu consegui fazer isto, sou capaz disto’. Enfim, que esteja constantemente presente para dar força à mulher nesse sentido. É como se fosse um amuleto.”
Uma das peças que mais sucesso tem feito é o “family necklace”, como o próprio nome indica, o colar da família: “Sem dúvida, as pessoas têm-se sentido muito ligadas ao colar pelo simbolismo que tem”.
Outra das joias mais apreciadas tem sido o colar “small boomerang”, sob a premissa de que “aquilo que damos ao mundo volta para nós”.
O packaging também é reciclado e foi desenvolvido dentro de portas, de forma a ter também uma opção sustentável para albergar as peças da Wonther.
Um novo modelo de negócio
Com mais de 200 peças vendidas nos primeiros dois meses de operação, a Wonther quer ir mais além e criar, ainda, um novo modelo de negócio para a compra e venda de ouro.
“Em vez de as pessoas venderem as peças que geralmente têm valor emocional para as famílias, as pessoas vão poder fornecer a sua matéria-prima para criar uma peça Wonther. Vamos criar um modelo de economia circular em que uma pessoa tem uma peça, já não a usa, mas tem um valor emocional elevado. O que importa é o que está no interior, ou seja, a pessoa pode enviar-nos a peça, nós tratamos de todo o processo e podemos criar uma peça à escolha do cliente”, explica Olga Kassian.
A ideia é dar nova vida às joias de família, projeto que a empresária espera ter de pé ainda este ano.
No que toca ao negócio já montado, a Wonther quer agora cimentar as vendas em Portugal e apontar a outros países da Europa, como Alemanha, França e Reino Unido e também Estados Unidos da América.
Boas práticas a respeitar
Para certificar as empresas, o RJC criou um Código de Práticas que todos os membros devem seguir. O código é composto por 42 disposições que têm por base seis objetivos gerais:
1. Requisitos gerais – para melhorar a conformidade legal e regulamentar, fortalecer os relatórios públicos e garantir um compromisso com práticas comerciais responsáveis;
2. Cadeias de suprimentos responsáveis, direitos humanos e diligências devidas – aumentar o uso de diligências nas cadeias de abastecimento para defender os direitos humanos, apoiar o desenvolvimento da comunidade, promover esforços anticorrupção e gerir riscos de abastecimento;
3. Direitos dos trabalhadores e condições de trabalho – para cumprir as convenções internacionais de trabalho e garantir condições de trabalho responsáveis;
4. Saúde, segurança e meio ambiente – proteger a saúde e a segurança das pessoas e do ambiente, tal como usar os recursos naturais de maneira eficiente;
5. Produtos de ouro, prata, PGM (metais do grupo da platina), diamante e pedras preciosas coloridas – controlar e divulgar adequadamente informações sobre produtos e evitar práticas de marketing enganosas;
6. Mineração responsável – garantir práticas de exploração e mineração que protegem comunidades e ambientes potencialmente afetados de impactos adversos.