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João Miguel Rodrigues é designer industrial e tem a sua empresa em Ovar

“Matéria-prima não tardará a esgotar-se”, diz empresário de Ovar

Por: Mariana Barros Cardoso

Há já vários dias que foi decretado o estado de calamidade em Ovar. O novo coronavírus veio assim afetar empresas e negócios locais à exceção dos negócios de bens essenciais. Esta medida, decretada pelos Ministros da Administração Interna e da Saúde, é a mais grave das medidas de Proteção Civil e apenas executada em casos de extrema necessidade.

Assim aconteceu em Ovar devido ao aumento significativo de casos e de forma a fazer os possíveis para não propagar mais o vírus. É assim que surge a criação da cerca sanitária.

A PME Magazine falou com João Miguel Rodrigues, um empresário de Ovar, que nos conta como é que se preparou e qual é o comportamento da população de Ovar nesta situação atual.

PME Magazine – Como é que foi enquanto empresário de design industrial perceber que o país ia, de certa forma, parar?
João Miguel Rodrigues – Quando comecei a ver os casos em Itália a crescerem exponencialmente, sabia que era uma questão de poucas semanas até sermos afetados. O facto de ainda não haver uma vacina ou um tratamento eficaz para o tratamento do novo coronavírus fez-me pensar no pior.

PME Mag – Em que medida é que isso afeta o seu negócio, a sua atividade?
J. M. R. – A “Lusitan Furniture” para já está a trabalhar com o stock que tem, a matéria-prima principal não foi afetada, mas será numa questão de dias até as empresas que me abastecem encerrarem no meu entender (a nível internacional). Também tenho estúdio de serviços de Design Industrial em nome próprio que oferece uma “almofada” financeira para esta fase mais incerta.

PME Mag. – Quais são as medidas que aplicou para fazer face a esta crise na saúde?
J. M. R. – Teletrabalho. Estou em casa a trabalhar em várias frentes (Lusitan e estúdio Rodrigues dos Santos), não pondo assim em risco a minha e a saúde e a dos outros.

PME Mag. – Já pensou em medidas pós crise na saúde para colmatar a crise financeira que virá depois?
J. M. R. – Sim. Enquanto que a crise de 2008 era uma crise “estrutural” motivada pela irresponsabilidade da banca, e que levaria muitos anos a ser resolvida, penso que esta crise se resolverá em pouco tempo, pois não há no imediato nenhum problema estrutural comparável ao de 2008. Há pouco dinheiro a circular, que retomará o seu percurso mal esta epidemia passe ou diminua. Por isso penso que 2021 será um ano de retoma. Temos de apertar um bocado o cinto para este ano no meu entender. Quero acreditar que seja assim. Entretanto aproveito este tempo para começar a desenvolver a nova coleção para 2021 e a trabalhar no backoffice do site e integrar uma plataforma de e-commerce.

PME Mag. – O que é que mudou com o estado de calamidade em Ovar?
J. M. R. – Muito. O meu estúdio é em Ovar, mas atualmente moro no concelho vizinho de Santa Maria da Feira. Não consigo aceder à cidade por causa da cerca sanitária, mas concordo com as autoridades, são para o nosso bem maior.

PME Mag – A nível de produção/encomendas/contactos externos, a aplicação de estado de calamidade afetou o seu negócio?
J. M. R. – Obviamente, penso que ninguém escapa a esta “paragem” económica, seja por falta de matéria prima ou por outro lado, falta de clientes. Os contactos continuam a ser feitos de forma virtual (E-Mail e Skype). Terei certamente uma quebra de receita nas próximas semanas que virão.

PME Mag – De que maneira?
J. M. R. – No meu caso será mesmo pela falta de matéria-prima que não tardará a esgotar-se ou a demorar nas entregas (Tecidos, madeiras e espumas) e, por conseguinte, não consigo produzir.

PME Mag. – Há previsão para vocês, locais, de uma data de término disto?
J. M. R. – A cerca sanitária estava prevista para durar até dia 2 de abril, mas será ampliada talvez no mínimo por mais 15 dias porque a situação ainda está longe de estar controlada em Ovar. É uma incerteza. Temo pelos restantes negócios como o pequeno comércio Ovarense que depende das vendas “diretas” a este público, vistos que pelo decreto em Diário da República devem estar encerrados no concelho de Ovar até ser decretado o fim do estado de calamidade.

PME Mag – Quais vê serem os maiores riscos para a economia da autarquia com este estado de calamidade e a sua duração?
J. M. R. – No imediato vai ser um golpe profundo, pois os estabelecimentos têm de estar encerrados de forma obrigatória (excetuando os de primeira necessidade). É muito incerto. Haverá muita gente que poderá perder o emprego e será complicado no imediato. Mas como disse anteriormente quero acreditar que a retoma será imediata e o emprego voltará em força em pouco tempo.

PME Mag – O que é que Ovar pode, neste momento, fazer por Ovar, pelos seus cidadãos e pelas empresas que aí existem?
J. M. R. – Os ovarenses para já estão a manter a ordem e a calma, o que me surpreende pela positiva. Poderia haver aquele pânico descontrolado, mas não há. Para já, a Câmara Municipal de Ovar (CMO) acho que fez um bom trabalho em decretar o estado de calamidade, é preciso conter o vírus primeiro (sem pessoas não há economia). É duro, mas foi a decisão mais acertada para evitar uma tragédia maior. Noutros campos penso que a CMO poderá ter um papel ativo, no auxílio ao restabelecimento dos negócios do município juntamente com o apoio do Governo. Ovar infelizmente poderá ser o concelho mais afetado por esta situação (toda a sua indústria está parada) pelo que vamos necessitar de muita ajuda.

Recorde-se que Ovar está em estado de calamidade com cerca sanitária há mais de duas semanas e o registo de morte mais jovem pelo Covid-19 ocorrida em Portugal foi uma criança de 14 anos, de Ovar.