Home / Empresas / Empreendedorismo / “Startups e principais líderes do turismo foram forçados a reinventar-se” – António Lucena de Faria
António Lucena
António Lucena, fundador e CEO da Fábrica de Startups (Foto: Divulgação)

“Startups e principais líderes do turismo foram forçados a reinventar-se” – António Lucena de Faria

O Tourism Explorers é um programa nacional de criação e aceleração de startups, em parceria com o Turismo de Portugal, no âmbito do Programa FIT – Fostering Innovation in Tourism. Esta iniciativa decorre em 12 cidades e pretende capacitar empreendedores de todo o país, ajudando a reduzir as assimetrias regionais. António Lucena de Faria, fundador e CEO da Fábrica de Startups, fala acerca do projeto, este ano na quarta edição, refletindo ainda acerca da reinvenção do turismo, no atual contexto de pandemia.

PME Magazine – No que consiste o Programa FIT?

António Lucena de Faria – A Fábrica de Startups foi uma das aceleradores pioneiras que se aliou ao Turismo de Portugal e ao programa FIT – Fostering Innovation in Tourism em 2015, data da sua criação. O programa FIT – Fostering Innovation in Tourism é uma iniciativa do Turismo de Portugal com o objetivo fomentar o empreendedorismo e inovação, através de um protocolo assinado com cerca de 40 incubadoras e aceleradoras portuguesas. No ano da sua criação, lançámos o Discoveries, um programa de aceleração para startups internacionais. O Discoveries é um programa internacional, com duração de um mês, onde startups de todo o mundo vêm para Lisboa fazer a validação do seu modelo negócio. Este programa vai já na sua sexta edição e contou com mais de 190 empreendedores e 82 startups, 59% das quais continuam, ainda hoje, ativas. O protocolo ao abrigo do Programa FIT prevê duas tipologias de iniciativas: uma focada na ideação, ou seja, criação e desenvolvimento de novas ideias, e outra focada na aceleração, isto é, validação e crescimento do negócio. A Fábrica de Startups trabalha as duas vertentes, através do Discoveries e do Tourism Explorers e, pela primeira vez, teremos este ano uma terceira iniciativa num modelo Open Innovation, aproximando as startups das grandes empresas do setor. Ao longo dos últimos cinco anos, a Fábrica de Startups já realizou oito programas ao abrigo deste protocolo com o Turismo de Portugal, das quais participaram já 380 startups, cerca de 42% da totalidade de startups apoiadas a nível nacional.

PME Mag. – Relativamente ao programa Tourism Explorers, como surgiu?

A. L. F. – Em 2016, a Fábrica de Startups já realizava programas de ideação, nomeadamente na área do turismo, com o objetivo de dar resposta a desafios concretos do setor. Em 2017, decidimos lançar o desafio ao Turismo de Portugal de realizar um programa de ideação, para além de aceleração. O objetivo seria criar um programa de âmbito nacional, que contribuísse para a descentralização da oferta turística e para a capacitação dos ecossistemas regionais, fora dos grandes centros urbanos. Assim surgiu o conceito do Tourism Explorers, em 2017, ano em que decorreu a primeira edição. A questão que se impunha era: como conseguiríamos garantir o apoio aos projetos em várias cidades ao mesmo tempo? Em 2015, a Fábrica de Startups já tinha criado a iniciativa “Consultores Digitais” em parceria com o IFEP, com o objetivo de capacitar um conjunto de pessoas por todo o país através de live streaming. E foi este conhecimento e experiência que deram origem ao conceito do Tourism Explorers, o maior programa de ideação e aceleração de startups na área do turismo, a acontecer em simultâneo em 12 cidades, espalhadas pelo território nacional, incluindo ilhas. O objetivo do Tourism Explores é, numa primeira fase, convidar as pessoas a contribuir com as suas ideias para inovar o setor do turismo nas suas cidades, para, depois, na fase seguinte, participarem na aceleração onde vão validar o seu negócio no mercado. A Fábrica de Startups tem duas metodologias distintas para cada uma das fases, a primeira é a FastIdea, centrada em princípios de brainstorming, design thinking e valor criado das ideias, e a segunda, FastStart, baseada nos princípios LeanStartup e do Business Model Canvas do Alex Osterwalder. De forma a garantir o sucesso do programa nas 12 cidades, criámos parcerias com escolas de turismo, universidades, politécnicos, incubadoras e aceleradoras com o objetivo de, em conjunto, contribuir para a geração de novos negócios de sucesso. O objetivo do Tourism Explorers é semear o maior conjunto de sementes possíveis de forma a conseguirmos colher mais e melhores frutos.

PME Mag. – Qual o feedback relativo às edições anteriores?

A. L. F. – O Tourism Explorers vai já na sua quarta edição e conta com mais de 730 participantes espalhados pelas 17 cidades pelas quais o programa já passou. Durante as últimas três edições, tivemos connosco 289 startups, todas cheias de vontade de fazer a diferença e contribuir para o desenvolvimento do setor. O nível de satisfação das equipas é sempre bastante positivo, atingindo os 8/10 na última edição. O valor do programa para os participantes está centrado em três componentes: a metodologia, a mentoria e o networking. A metodologia da Fábrica de Startups está organizada através de um conjunto de exercícios que as equipas vão fazendo ao longo dos bootcamps. Estes exercícios fazem parte da nossa Startup Box, que é um kit de inovação onde no final do programa as equipas conseguem ter uma concretização e sistematização do trabalho desenvolvido. A Fábrica de Startups dispõe de um conjunto de cerca de 50 mentores, espalhados pelo mundo, com o objetivo de ajudar as startups. Estes mentores têm áreas de especialização diferentes, de forma a conseguirmos dar melhor resposta à diversidade de projetos que participam no Tourism Explorers. Por último, o networking é sempre apontado como uma das mais-valias do programa, pois todas as equipas, das 12 cidades estão em contacto umas com as outras, onde já assistimos a situações de parceria, fusões e trocas comerciais. Realizamos, no início deste ano, um estudo com o intuito de medir o impacto do programa no desenvolvimento e atividade das startups que passaram nas três primeiras edições. Das 242 startups contactadas, conseguimos perceber que 60% continuam ativas, 23% receberam investimento e 13% já internacionalizaram o seu negócio. Este é o melhor feedback que podemos receber, saber que as startups que passam pelos nossos programas conseguem perseguir e atingir o seu sucesso. Temos vários casos de sucesso mais mediáticos como a Live Electric Tours que, além do investimento que recebeu de 700 mil euros, foi também eleita a Melhor Startup de Turismo da Europa em 2018, pela Startup Europe Awards, uma iniciativa da Comissão Europeia, ao abrigo de uma parceria com a Fábrica de Startups.

PME Mag. – Qual o impacto pretendido com este programa?

A. L. F. – O Tourism Explorers tem como principal objetivo apoiar empreendedores e startups no desenvolvimento de negócios no setor do turismo, e a sua estratégia de continuidade pretende cumprir a missão de estimular o empreendedorismo na atividade turística. Pretendemos capacitar startups, empresas e empreendedores e fomentar a inovação e o crescimento competitivo do turismo em Portugal. Na edição de 2020, especificamente, pretendemos contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento de novos negócios no setor do turismo, para a descentralização das iniciativas e para a democratização no acesso a incentivos ao investimento. Assumimos uma aproximação junto dos potenciais players da indústria, em cada uma das 12 cidades onde vamos estar presentes. O impacto de um programa com estas características mede-se de forma qualitativa com a redução das assimetrias regionais, a capacitação de empreendedores de todo o país, o incentivo ao desenvolvimento e consolidação de novos negócios na área do turismo. Estamos a democratizar o acesso a informação, a metodologias para desenvolvimento de produto, e assim pretendemos reduzir o risco associado ao lançamento de novos produtos no mercado. Mas também de forma quantitativa, através dos dados do impact report realizado no início de 2020 a uma amostra superior a 80% das 298 startups participantes. Os programas ao abrigo do FIT cumprem sempre uma orientação muito concreta, com os desafios estratégicos do Turismo de Portugal aos quais os empreendedores devem dar resposta. Estes desafios este ano estão muito focados na situação pandémica. Neste sentido, os desafios que as startups e empreendedores do Tourism Explorers devem responder são: soluções digitais para as PME, economia ambiental e sustentabilidade, valorização do património local, gestão de dados, melhorar a experiência do turista, sazonalidade e a dispersão territorial. Este ano, a quarta edição do Tourism Explorers chega a novas cidades, novos parceiros e novos empreendedores, estando presente em Aveiro, Beja, Caldas da Rainha, Coimbra, Covilhã, Évora, Faro, Lisboa, Porto, São Miguel, Setúbal e Viseu. As candidaturas estão abertas até ao dia 7 de outubro.

PME Mag. – De que forma pode o setor do turismo reinventar-se e dar resposta ao impacto negativo causado por esta pandemia?

A. L. F. – Desde o início da pandemia que se percebeu que o setor do turismo, cujas receitas em 2019 foram responsáveis por 8.7% do PIB nacional e sendo o setor com maior atividade económica, seria um dos mais afetados. Também foi claro para nós que startups e principais líderes do setor do turismo foram forçados a reinventar-se. Aquelas empresas e startups que tiverem mais agilidade organizacional e tiverem capacidade de repensar os seus modelos de negócio são aquelas que acreditamos terem mais probabilidade de sucesso. Quando perspetivamos o turismo no futuro, pensamos em novas formas de consumo, transformação digital e em tecnologia que permite uma nova experiência do consumidor. Essas características, aliadas à valorização dos ativos diferenciadores do turismo em Portugal, fazem-nos olhar para o futuro com confiança. Neste primeiro momento, o mercado do turismo e da hotelaria terá necessariamente de se centrar no mercado interno (e europeu), nunca descurando o nível de serviço e de qualidade que temos vindo a criar nos últimos anos. Nesse sentido, redes colaborativas e produtos integrados em zonas específicas do país têm sido apontadas como essenciais na retoma da atividade turística. Já há alguns casos de sucesso neste processo de criação de ofertas diferenciadoras. Um dos exemplos é o caso das visitas virtuais nas ilhas Faroe, onde os turistas podem visitar as ilhas através dos olhos de um local com a ajuda de uma aplicação no telemóvel onde podemos “controlá-lo”, pressionando os botões “correr” ou “saltar” ou navegando para esquerda ou direita. Em menos de um mês foram feitas mais de 20.000 visitas virtuais. Em Portugal, vários museus fizeram também esta adaptação criando circuitos virtuais para as suas coleções. Noutras alturas de crise fomos capazes de olhar com optimismo para o futuro e fomos capazes de nos superar. Com o apoio de iniciativas como o Tourism Explorers, entre outros programas organizados pela Fábrica de Startups, estamos certos que podemos ajuda a minimizar o impacto causado por esta pandemia.