Por: Filipa Lemos Cristina, embaixadora do projeto europeu DigiEduhack e Fundadora da PowerUP
A recente criação de um grupo de trabalho para a reforma da formação profissional em Portugal demonstra um compromisso sério com a qualificação da força de trabalho e a preparação para os desafios da Economia 4.0 (Despacho n.º 1391/2025).
No entanto, à medida que se discute a necessidade de atualizar competências técnicas, continua a faltar um elemento crítico: o desenvolvimento das competências humanas ou power skills, que são essenciais para garantir uma adaptação eficaz e sustentável às novas realidades do mercado.
A digitalização e a automatização estão a transformar radicalmente o mundo do trabalho. Se as competências técnicas são essenciais, são as competências humanas que permitem que os profissionais se diferenciem, colaborem eficazmente e se adaptem às constantes mudanças. Sem estas competências, a formação profissional arrisca-se a formar trabalhadores preparados para a tecnologia, mas não para as dinâmicas humanas do futuro do trabalho.
Vários relatórios do World Economic Forum (WEF), desde 2020, identificam as competências humanas como fatores críticos de sucesso. Estudos da McKinsey reforçam essa ideia, demonstrando os benefícios que estas competências trazem tanto para os indivíduos como para as organizações.
Entre elas destacam-se a colaboração, essencial em ambientes digitais e descentralizados, onde a capacidade de trabalhar eficazmente em equipa, seja remotamente ou em modelo híbrido, impacta diretamente a produtividade e a inovação. A comunicação torna-se cada vez mais vital num contexto de sobrecarga informativa, exigindo clareza, persuasão e eficiência para evitar ruídos e maximizar resultados. A criatividade, por sua vez, assume um papel diferenciador num mercado onde a Inteligência Artificial (IA) está a automatizar processos, tornando essencial a capacidade de resolver problemas de forma inovadora. O pensamento crítico ganha relevo num mundo saturado de informação e desinformação, exigindo que os profissionais saibam analisar cenários, questionar pressupostos, pensar estrategicamente e tomar decisões informadas. Por fim, a empatia surge como
competência-chave para liderar equipas, motivar colaboradores e garantir ambientes de trabalho saudáveis, contribuindo para a retenção de talento e para o fortalecimento da cultura organizacional.
A reforma da formação profissional não se pode limitar a ajustar currículos técnicos. É necessário adotar metodologias que promovam o desenvolvimento destas competências humanas. Para isso, é essencial recorrer aos princípios da neurociência, explorando como o cérebro aprende de forma eficaz e sustentável. A aprendizagem ativa, através de experiências imersivas, simulações e desafios interativos, potencia a retenção de conhecimento e a aplicação prática das competências adquiridas.
Além disso, é crucial dispor de ferramentas de medição das competências que permitam
diagnosticar o ponto de partida, planear intervenções personalizadas e avaliar o impacto ao longo do tempo. Estas ferramentas devem possibilitar uma monitorização contínua, permitindo ajustes nos planos de ação e assegurando que a evolução das competências está alinhada com as necessidades do mercado e das organizações.
Se queremos um mercado de trabalho mais resiliente e preparado para os desafios futuros,
precisamos de uma formação profissional que valorize tanto as competências técnicas quanto as humanas. A aposta nas power skills não é um complemento, mas sim uma necessidade estratégica.
Que a reforma da formação profissional em Portugal seja realmente inovadora e tenha a coragem de incluir aquilo que, até agora, tem ficado em segundo plano: as competências humanas que garantem o sucesso das empresas e das pessoas.