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Sandra Rodrigues, CEO AzeitaoZen alojamento local
Sandra Rodrigues, CEO da AzeitaoZen (Foto: Divulgação)

As dificuldades do alojamento local face à Covid-19

Por: Sandra Rodrigues, CEO da AzeitaoZen, Grupo Turismo Zen

Prometia ser um 2020 fantástico, arrisco-me mesmo a dizer o melhor de todos os anos!

Em janeiro, a agenda já estava com 90% de reservas para o verão com hóspedes estrangeiros, na maioria franceses. Os Retiros do Silêncio preenchiam já o resto do ano. No início de março, começámos a perceber que algo estava a mudar, foi pedido à população portuguesa que as nossas crianças ficassem em casa. Perguntei-me: o que vai acontecer com as nossas crianças, aos pais, aos professores, aos nossos carinhosos idosos, em resumo, o que está a acontecer em Portugal?

O primeiro cancelamento chega-nos por uma plataforma de reservas no dia 11 de março de 2020, de um grupo proveniente da Alemanha, que refere mesmo que por causa da Covid-19 não arriscam fazer a viagem a Portugal. A reserva era de 16 a 20 de março.

No fim-de-semana anterior (13 a 15 de março) a ser decretado o estado de emergência, já todos muito alarmados pelas notícias que corriam em todos os media e nas redes sociais, começámos a receber chamadas e emails de todos os participantes do Retiro de Silêncio a questionarem-nos se ainda seria realizado. Percebemos que estavam assustados. Decidimos que não iria realizar-se porque as condições emocionais necessárias estavam já afetadas.

Os nossos retiros funcionam muito no sentido de uma introspeção interior e com o isolamento total do exterior e, com tudo que se estava a passar, seria totalmente impossível essa entrega, não iria ter a mesma magia, até os abraços não iriam ser dados com intensidade. O medo do desconhecido iria estar presente.

Decidimos encerrar as portas nesse mesmo fim-de-semana, foi o pior dos sentimentos. Fechar, olhar para trás, sem saber quando tudo voltaria à normalidade e podermos retomar a nossa atividade. Quatro dias depois, é decretado o estado de emergência.

Seguiram-se dois meses completamente parados, sem qualquer faturação, a zeros, mas com os mesmos encargos. Somos forçados a aderir ao lay-off para diminuir alguns custos.

Durante a quarentena, o positivismo continuou. Mesmo com cancelamentos diários, acabámos por ficar sem uma única reserva até finais de maio. Foi o momento de olhar para dentro e reinventar os dias.

Aproveitei este tempo para realizar cursos online, aprendizagem e partilha com grupos de coaching e de alojamento. Li, escrevi bastante, arrumei e organizei muitas coisas que fui deixando de fazer, por ter sempre o meu tempo tão ocupado. Porém, confesso que o mais importante deste isolamento foi ter sido mãe a tempo inteiro. Uma mãe presente 24 horas na vida do meu filho.  

A nível profissional, a equipa esteve sempre em contacto através de pequenas reuniões online. Programámos o verão e reinventámos atividades para tornarmos o nosso regresso mais apelativo. Estabelecemos as obras que queríamos realizar, remodelação e decoração. Fizemos um refresh em todos os nossos alojamentos.

Foi uma época muito difícil, até porque percebemos que o produto que tínhamos (temos) no mercado não era de todo procurado. Como alugar um espaço se nos é pedido para ficar em casa? Como pensar em férias com tudo isto a acontecer? Os portugueses respeitaram, e bem, o estado de emergência e nós também – apesar de estarmos bastante apreensivos com o nosso futuro profissional. A cada dia que passava as notícias eram cada vez piores em relação ao turismo.

Até aqui, a expectativa em relação ao verão ainda se mantinha, acreditámos sempre que não haveria alterações na época alta, contudo, em maio começámos a receber cancelamentos de temporadas por parte dos nossos hóspedes estrangeiros para o verão. Um misto de emoção: por um lado é declarado o estado de calamidade e, por outro, um desespero, pois todos os dias surgiam mais más notícias aqui e no mundo e a nossa agenda estava a ficar sem marcações.

Em meados de maio, regressámos à luta. Todos empenhados e positivos de que iríamos, apesar de todas as contrariedades, vencer. Deitámos mãos à obra, fazendo uma limpeza profunda de acordo com as indicações da DGS, conseguimos o nosso selo “Clean and Safe” e o apoio ao projeto Adaptar. As obras programadas começaram a realizar-se e, a contrarrelógio, surge a primeira reserva para 20 de maio.

Reabrimos ao público nesse mesmo dia, 20 de maio, um dia solarengo em que os hóspedes estavam ansiosos e sedentos de usar o espaço exterior e a piscina privada e, mais importante, limpos e seguros.

Percebemos que estávamos todos saturados, cansados, exaustos de tanto confinamento em casa, que desta forma apostámos em atividades outdoor. Realizámos parecerias para podermos oferecer aos nossos hóspedes um leque de atividades para toda a família em privado.

Tenho conhecimento de colegas que decidiram este ano não voltarem a abrir portas, passando para aluguer de longa duração e outros encerraram empresas.

Sei que é impossível recuperar o que deixámos de ganhar na pandemia mas, felizmente, aos poucos, a nossa agenda começa a ganhar vida, porque os nossos alojamentos têm piscinas privadas. Temos um junho fantástico e está bem encaminhada a época até outubro. Época alta com hóspedes maioritariamente portugueses e, a partir de outubro, reiniciar os nossos retiros.

Não sou uma mulher de baixar os braços e, apesar de todos estes altos e baixos, consegui arranjar forças para continuar. Sinto-me de volta e mais fortalecida com a certeza de que tudo nunca mais será igual, apenas diferente.

Em nome de todos os meus colaboradores e parceiros de grupo, agradeço todo o apoio. Gostaria ainda de deixar um abraço a todas pessoas espalhadas por esse mundo fora que viram partir entes queridos.