Por: Mafalda Marques
O ISCTE-IUL, em Lisboa, vai ser o palco do primeiro Fórum Nacional para a Diversidade, no próximo dia 22 de maio. Uma iniciativa levada a cabo pela organização da Carta Portuguesa para a Diversidade e que terá como convidados, entre outros, o ministro Adjunto, Eduardo Cabrita, e as secretárias de Estado para a Cidadania e Igualdade, Catarina Marcelino, e da Inclusão das Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes. O evento contará, ainda, com a presença da francesa Isabelle Pujol, ex-responsável para a Diversidade e Inclusão da BP , que há 11 anos fundou a Pluribus Europe, uma consultora francesa que apoia organizações em todo o mundo nas temáticas da Diversidade e Inclusão. Em entrevista à PME Magazine, conta os verdadeiros desafios da inclusão dentro das organizações.
PME Magazine – Quando decidiu criar a Pluribus Europe?
Isabelle Pujol – Tive uma carreira fantástica na BP, onde passei quase 18 anos. Em 1992 comecei a envolver-me em alguns projetos de diversidade e inclusão e, nessa altura, o foco na BP era perceber e abordar o facto de haver poucas mulheres em posições de topo. Tornei-me na primeira responsável pela Rede Europeia de Mulheres na Liderança [European Network for Women in Leadership], que rapidamente tornou-se na primeira Rede Europeia da Diversidade [European Diversity Network]. Iniciámos uma série de ações positivas, como o mentoring e atividades de job shadowing [n. d. r. seguir um profissional no seu ambiente de trabalho durante um certo período]. Em 1998, fui nomeada a primeira responsável de Diversidade e Inclusão a tempo inteiro para o grupo [BP], sedeado em Londres, antes de mudar-me para a Alemanha, em 2002, como membro da equipa de liderança e do conselho consultivo da BP Alemanha. O meu trabalho era apoiar a integração cultural, uma vez que a BP tinha acabado de adquirir uma empresa alemã com dez mil trabalhadores que iam ser integrados numa organização anglo-saxónica. Depois de quatro anos neste papel, tornou-se claro que era tempo de mudar e dedicar a minha paixão à diversidade e inclusão fora do mundo da BP. Foi aí que decidi criar a Pluribus e tenho muito orgulho em dizer que a Pluribus fez dez anos em novembro de 2016!
PME Mag. – Como é que a Pluribus ajuda organizações a tornarem-se mais inclusivas?
I. P. – A Pluribus, inicialmente, era uma consultora europeia e tornou-se num parceiro verdadeiramente global em projetos de diversidade e inclusão (D&I) em todo o mundo. Cerca de 60 consultores apaixonados por D&I trabalham com a Pluribus, partilhando a sua paixão, perícia e conhecimentos com várias organizações. Estamos empenhados em apoiar pessoas, equipas e organizações para serem bem-sucedidas na diversidade e inclusão e usarem esta perspetiva em conhecimentos de liderança, comunicação, gestão da mudança, team building, etc. Normalmente, quando temos um novo projeto, começamos com uma fase de diagnóstico para avaliar o nível e a perceção de inclusão dos colaboradores ou gestores e perceber os fatores positivos e obstrutivos. Construir a inclusão é a chave na nossa abordagem. Antigamente, as organizações focavam-se apenas na diversidade. Nós tentamos assegurar-nos que as organizações trabalham agora do lado da inclusão. A diversidade é uma realidade, mas a inclusão é uma escolha. Nós encorajamos as organizações a fazerem essa escolha! Devido aos nossos conhecimentos estratégicos e operacionais, conseguimos apoiar as organizações no desenvolvimento de uma estratégia forte de D&I, envolvendo a gestão de topo, desenhando intervenções estratégicas e de aprendizagem, apoiando os responsáveis para que sejam mais inclusivos, construindo um plano de comunicação e monitorizando o seu progresso. Tornar-se mais inclusivo, quer ao nível pessoal quer ao nível organizacional, é uma viagem. Não acontece do dia para a noite e leva tempo.
PME M. – Que organizações já apoiaram neste processo?
I. P. – Nós criamos relações de longo prazo com os nossos clientes. Na verdade, consideramos estas relações como verdadeiras parcerias. Temos apoiado organizações mundiais, como a Sodexo, a L’Oréal, Hilti, Total, Solvay, Sanofi ou a Carrefour já há muitos anos. Temos orgulho em dizer que, num estudo recente da Equileap sobre igualdade de género, a L’Oréal ficou em primeiro no ranking e a Sodexo em quarto!
PME M. – Fale-nos um pouco do seu trabalho na BP.
I. P. – O meu trabalho era envolver as equipas de liderança de várias unidades de negócio em diferentes zonas do mundo para perceberem a importância de ser inclusivo e de criar um ambiente de trabalho mais inclusivo, de forma a valorizarem as diferentes facetas da diversidade dos membros das suas equipas. Eu era responsável pelas regiões da Europa e Médio Oriente e também por identificar ações globais para apoiar a igualdade de género da indústria petrolífera. Um exemplo específico era criar mais inclusão entre mulheres e homens a trabalharem juntos através da perceção e valorização das suas singularidades, pontos em comum e diferenças.
PME M. – O que é que uma organização deve fazer para tornar-se mais inclusiva?
I. P. – Dou alguns exemplos: os CEO e as equipas de gestão devem estar conscientes da importância da D&I e isso deveria ser incorporado na visão e objetivos das suas empresas; é preciso dar o exemplo, não se pode promover D&I sem ter alguns sinais visíveis da gestão de topo, nomeadamente premiar gestores e colaboradores inclusivos (como parte das suas competências de liderança); delinear estratégias de D&I que enfatizem a importância de valorizar a singularidade em vez de criar “rótulos”; assegurar processos de gestão de recursos humanos justos e inclusivos (recrutamento, promoção, etc.), através da eliminação do enviesamento inconsciente (ao nível individual e nos processos); e aumentar a sensibilização e construir ferramentas de diversidade e inclusão a todos os níveis da organização.
PME M. – Temos assistido a um aumento dos crimes de ódio. O caminho ainda é longo para termos um mundo inclusivo?
I. P. – infelizmente, as pessoas, por natureza, têm medo das diferenças. Preferem ficar na sua zona de conformo e lidar com pessoas com quem têm pontos em comum. Ficam na defensiva. Por isso, sim, de certa forma, ainda há um longo caminho a percorrer para termos um mundo inclusivo. Mas, ao mesmo tempo, acredito vivamente nos pequenos passos. Acredito mesmo que nós conseguimos trazer uma mudança positiva para o nosso próprio mundo, influenciar e fazer a diferença. É por isso que passar das palavras aos ator é essencial para mim. Como disse Gandhi: “Sê a mudança que queres ser no mundo”.
PME M. – O que espera encontrar nas organizações portuguesas?
I. P. – As organizações portuguesas que começam agora fazer do tópico da D&I um tema estratégico vão beneficiar das aprendizagens de outros países que começaram este trabalho há uns anos. Espero que não caiam na esparrela de alguns falhanços do passado, como focarem-se apenas no tópico das mulheres ou nos temas da diversidade sem tem o verdadeiro objetivo de criar uma cultura inclusiva transversal.
PME M. – Qual a importância das organizações e de os países adotarem a Carta para a Diversidade?
I. P. – É crucial que as organizações e os países adotem a Carta para a Diversidade e, abertamente, mostrem o seu envolvimento na valorização da diversidade através da inclusão. Este compromisso tem de ser visto interna e externamente e pode ser um catalisador para aumentar a sensibilização, criar ferramentas e pôr em prática ações simples, mas simbólicas. As empresas e os países precisam, ao mesmo tempo, de ser claros quanto às suas ambições. Não deve tratar-se apenas de uma questão de reputação, mas sim de uma vontade genuína de ter um papel ativo nas sociedades de hoje, sendo mais progressivo e respeitador das nossas diferenças e semelhanças. Em última análise, isso terá um impacto na motivação, lealdade, inovação e desempenho: uma abordagem win-win para colaboradores, empregadores e para as sociedades em geral.