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Pablo Rueda, partner manager da Selligent Marketing Cloud Ibérica
Pablo Rueda, partner manager da Selligent Marketing Cloud Ibérica (Foto: D. R.)

“Não acredito que voltemos à normalidade” – Pablo Rueda

Por: Afonso Godinho

Com a atual situação pandémica, o recurso ao digital tem demonstrado ser uma ferramenta de apoio para muitas empresas, que assim viram uma forma de se continuarem a desenvolver. Neste sentido, a Selligent Marketing Cloud Ibérica tem vindo a apresentar soluções de automação de marketing, área na qual é líder a nível ibérico e em que cada vez mais empresas têm vindo a apostar ao longo da pandemia.

Em entrevista à PME Magazine, Pablo Rueda, partner manager da Selligent Marketing Cloud Ibérica, aborda a evolução da empresa ao longo deste período pandémico, referindo algumas soluções e fatores importantes que as empresas devem ter em conta para o seu processo de transformação digital e desenvolvimento ao longo de períodos idênticos ao da atual conjuntura.

PME Magazine – Como avalia o progresso da Selligent Marketing Cloud Ibérica, ao longo do último ano? De que forma é que a pandemia veio alterar os vossos projetos e desenvolvimentos?

Pablo Rueda (P. R.) – Estamos a crescer de forma positiva, ainda que alguns dos setores nos quais temos uma forte presença tenham sofrido e continuem a sofrer bastante, como o do turismo ou o do entretenimento. A Selligent é uma solução de Marketing Automation e, como tal, de marketing digital, e claramente que durante a pandemia a importância da comunicação online cresceu. Os setores de distribuição tradicionais procuraram o contacto direto com os seus consumidores de forma mais evidente, pequenas empresas apoiaram-se na tecnologia para tentar manter os seus negócios e, por isso, a nossa plataforma tem sido uma grande aliada para as empresas neste período complicado que atravessamos.

PME Mag. – Com a atual situação pandémica, quais as principais tendências de mercado, em Portugal e no mundo para os próximos tempos?

P. R. – O facto de estarmos mais tempo em casa provocou uma viragem em muitos setores. Muitas marcas de moda produziram peças de roupa mais confortáveis para estar em casa; surgiram empresas de eletricidade alternativas com modelos mais sustentáveis; o teletrabalho e tudo o que ele envolve, nomeadamente internet mais fiável e espaço adaptado em casa passaram a ser uma necessidade. Tudo isto, por sua vez, gera novos hábitos de consumo, ou mais do que isso, acentua e acelera o que já tem vindo a produzir – a importância da presença online e da comunicação online como elemento-chave no processo de compra. Uma das consequências da pandemia foi a perda do poder de compra. Isto determina que as pessoas sejam muito mais conscientes do que compram, que vejam as coisas com muito mais atenção e priorizem as compras de produtos fundamentais. Se juntarmos a importância do digital com o impacto económico da pandemia, encontramos um cliente que opta por relacionar-se com quem oferece mais confiança a todos os níveis. Há cada vez menos pessoas que confiam cegamente numa marca. No nosso Consumer Index de 2020, revelamos que 81% de mais de 5 000 pessoas considera que a política flexível de devoluções/cancelamentos é importante; 76% afirma que protocolos de segurança claramente comunicados é fundamental; outros 76% declara que as aplicações em tempo real ou as atualizações por e-mail sobre as entregas e atrasos são cruciais. As expetativas mudaram. Os consumidores desejam notificações instantâneas em relação aos seus pedidos, além de quererem saber mais sobre vendas e ofertas, bem como a disponibilidade dos seus produtos favoritos. A maioria dos consumidores viram-se financeiramente afetados devido à pandemia. De acordo com o nosso Consumer Index, 75% dos consumidores sofreu impactos negativos nos seus empregos e rendimentos devido à Covid-19. Em consequência, 60% dos consumidores questionados priorizou as compras essenciais em relação às não essenciais.

As expetativas mudaram. Os consumidores desejam notificações instantâneas em relação aos seus pedidos, além de quererem saber mais sobre vendas e ofertas, bem como a disponibilidade dos seus produtos favoritos.

PME Mag. – Com o visível aumento do e-commerce, quais as principais mudanças no tecido empresarial? De que forma foi feita esta adaptação?

P. R. – Depende muito do segmento de mercado e dos setores, mas de uma forma geral assistiremos a um progressivo aumento da venda direta online, independentemente dos setores, sem que isso implique necessariamente o encerramento da atividade nas ruas (embora a pandemia já tenha ditado o fim de muitos pequenos negócios). Em empresas maiores, haverá a tendência de seguir em direção ao mundo online. No setor da saúde, por exemplo, já é prática comum o diagnóstico remoto, algo que era raro há dois anos. Deste modo, não há dúvidas em relação a esta tendência. Em todos os setores, haverá quem não saiba fazer esta transição e quem encontre aí a chave do seu crescimento.

PME Mag. – De que formas é que as empresas se podem preparar e investir nesta nova dinâmica digital?

P. R. – Quem foi “obrigado” a preparar-se agora, já deve ter percebido que começou tarde. Contudo, nunca é tarde demais se o plano for bem elaborado. Ter um plano de marketing claro, em que saibamos quem é o nosso cliente e tenhamos uma proposta de valor inteligível, é o início de todo o processo. Realço este aspeto porque apesar de parecer ser evidente, nem sempre acontece. A partir deste ponto, contar com as pessoas certas e com as tecnologias que permitem alcançar os nossos objetivos é fundamental. Sem dúvida que é um processo complexo, mas a vantagem do mundo online é que é mensurável. Os investimentos realizados para implementar campanhas que gerem leads, por exemplo, são monitorizáveis e podemos chegar a conclusões rapidamente. A mesma dinâmica deve ser seguida nas diferentes atividades do mundo digital, das mais focadas na captação de dados, na venda, ou na fidelização.

Em todos os setores, haverá quem não saiba fazer esta transição e quem encontre aí a chave do seu crescimento.

PME Mag. – Quais os principais obstáculos para o desenvolvimento da transição digital do país e consequente aumento da aposta no e-commerce?

P. R. – A transição de modelo implica uma mudança de mentalidade das empresas. Os recursos existem, as vantagens são claras, mas há que saber aproveitar a tecnologia adequadamente. A viragem, em plena pandemia, da empresa Nannyfy (Espanha), que passou de uma plataforma para contratar à hora uma “nanny” (babysitter) a uma aplicação de entretenimento e aprendizagem virtual como objetivo de se adaptar à realidade, alcançando um crescimento extraordinário, é um exemplo de agilidade, visão, conhecimento do negócio, utilização correta da tecnologia para apoiar a ideia. Outro exemplo é o modelo de ThepowerMBA, que desafia a formação de pós-graduação mais tradicional. Em última análise, o principal obstáculo é não ter a mentalidade adequada ao contexto em que vivemos.

PME Mag. – Que importância podem os métodos de pagamento como o MB Way ter nesta nova realidade digital? Quais os riscos de uma má gestão dos mesmos? Poderá este sistema manter a sua forte utilização, mesmo depois da pandemia?

P. R. – O pagamento com cartão multibanco aumentou exponencialmente porque, entre outras razões, foi uma recomendação expressa pela OMS enquanto medida de contenção do vírus. A tecnologia NFC generalizou-se, fazer compras através do smartphone é agora normal, e a implementação de métodos como o MB Way no mercado foi acelerada. Não podemos ter 100% de certezas, mas prevê-se que estes métodos e outros mais avançados de reconhecimento facial, ou os implementados pela Amazon Go Fresh (anteriores à pandemia) vieram para ficar. O seu impacto é evidente, facilitam a compra, proporcionam uma melhor experiência, e isto resulta de um aumento do ticket médio. O excesso de consumo individual ou possíveis problemas de segurança são os riscos associados à utilização de novas formas de pagamento. Implementar métodos de controlo de gastos e trabalhar com empresas fiáveis e de acordo com os maiores padrões de segurança é importante para minimizar os possíveis impactos negativos da maior facilidade de pagamento.

Os recursos existem, as vantagens são claras, mas há que saber aproveitar a tecnologia adequadamente.

PME Mag. – Quais os setores que se encontram melhor e pior preparados para esta evolução digital?

P. R. – Retail/moda, viagens, banca, educação, media, energia, seguros, telecomunicações: estes e outros setores já tinham plena consciência da necessidade de evoluir digitalmente, de conhecer o consumidor, de lhe oferecer o que necessita no momento oportuno, através do canal adequado. Este tem sido o “campo de batalha” há já alguns anos para muitas empresas, e dentro de cada setor, houve apostas mais focadas no mundo online, mais avançadas, e outras empresas que o fizeram a um ritmo mais lento. Aqueles que há alguns anos trabalharam na obtenção de dados de qualidade em troca do fornecimento de conteúdos ou experiências realmente relevantes aos utilizadores, saíram vencedores. Aqueles que menosprezaram a importância de conhecer os utilizadores são os que mais sofrem atualmente. Existem exemplos de ambas as práticas em todos os setores, mas o mais claro talvez seja o da Grande Distribuição, que nunca “precisou” de conhecer o seu utilizador e agora, de repente, torna-se um aspeto praticamente imprescindível. Também no mundo B2B, dependendo dos setores, existem muitas diferenças. O setor industrial viu poucas vantagens no mundo online, no entanto, empresas de prestação de serviços a outras empresas, desde uma consultora a uma agência de publicidade, já há muitos anos que oferecem conteúdo de qualidade e gerem adequadamente os seus contactos. Talvez a outra diferenciação relevante seja entre segmentos de mercado. Há micro, pequenas e médias empresas que encontraram no mundo digital um aliado, e para outras este mundo simplesmente não existe. 

PME Mag. – As tendências para uma aposta nos canais digitais, quer em empresas quer em e-commerce, apontam para uma continuidade destes modelos num cenário pós-pandémico? O que podemos esperar nos próximos anos?

P. R. – Sem dúvida. Não acredito que voltemos à normalidade de 2019. De acordo com um estudo da Mckinsey, 63% das empresas entrevistadas esperam que as mudanças nas expetativas e necessidades dos clientes permaneçam depois da pandemia. Para além disso, 54% acredita que a procura por serviços online continuará e que os consumidores comprarão com mais cautela, a quem confiam, e terão mais atenção com quem comunicam. Deste modo, a situação do mercado, em geral, será agravada pela pandemia, e assim vai continuar. Ao fim e ao cabo, faz parte de uma evolução já marcada no passado, que foi acelerada e permanecerá: um cliente mais exigente, mais online, mais capacitado, com mais oferta. Num estudo que realizámos há quase três anos, muitos clientes já nos diziam que esperavam de qualquer interação online um padrão “Amazon” de qualidade. Não esperavam menos, agora multiplica-se.

Há micro, pequenas e médias empresas que encontraram no mundo digital um aliado, e para outras este mundo simplesmente não existe. 

PME Mag. – Tendo em conta o panorama do tecido empresarial em Portugal, bem como a forma de preparação do país para uma forte transição digital, que conselhos poderia dar para que as empresas atingissem o sucesso de forma mais eficaz e rápida?

P. R. – Existe uma lacuna entre o que as pessoas exigem, o que as empresas oferecem e o que a tecnologia permite. Em qualquer mudança há componentes de vários tipos que têm de ser oferecidos para que a mudança se efetue. A nível tecnológico, existem ferramentas que permitem às empresas chegar onde desejam. A nível de pessoal, em Portugal há profissionais altamente preparados, capazes de desenvolver projetos muito complexos. Tenho a sorte de poder trabalhar lado a lado com agências de marketing, empresas do setor financeiro, e meios de comunicação em Portugal que já fazem um excelente trabalho no âmbito digital. Notei uma grande consciência em empresas de todas as dimensões, mas ao mesmo tempo um grande caminho a percorrer. Contudo, o problema é que os consumidores não esperam. Assim, aconselhá-lo-ia, em primeiro lugar, em não ter nenhuma dúvida de como o mundo digital é a chave da sobrevivência e crescimento das empresas. Dentro do digital há várias componentes que podem ser resumidas em duas: o pessoal e a tecnologia. Não é possível fazer marketing digital rigoroso sem perceber qual é a tecnologia que nos pode ajudar a realizar o nosso trabalho, de acordo com o nosso setor, segmento de mercado, atividade, etc. Dispor de uma pilha tecnológica adequada é essencial. E isto vale tanto para uma microempresa, cuja pilha tecnológica é uma web, WhatsApp, e-mail e Excel, como para uma grande empresa que necessite de ERP, CRM, CDPs, Marketing Automation, Datalakes, DMPs DSPs, e muitas outras tecnologias. Em segundo lugar, contar com a ajuda necessária de colaboradores (interna ou externamente), que podem realmente ajudá-lo a implementar o seu plano.