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Roberta Medina
Roberta Medina, vice-presidente executiva do Rock in Rio (Fonte Anne Karr)

“Procuramos trabalhar com marcas que tenham valores semelhantes aos nossos” – Roberta Medina

Por: Ana Vieira e Mafalda Marques


Foi em maio de 2004 que a Cidade do Rock atravessou o Atlântico e surgiu pela primeira vez em Portugal. Na estreia, mais de 385 mil pessoas passaram pelo Parque da Bela Vista para ver nomes como Paul McCartney, Peter Gabriel, Foo Fighters ou Britney Spears.

Dentro de dez dias, a festa repete-se, e este ano com uma nova morada, o Parque Tejo-Lisboa. Mais de 100 artistas vão-se distribuir por cinco palcos: Palco Mundo, Palco Galp, Palco Tejo, Super Bock Digital Stage e School of Rock CineStage, a que se juntam 13 espaços e atrações. 468 cabines sanitárias, incluindo femininas, masculinas, não binárias e adaptadas a mobilidade condicionada vão estar disponíveis a par de mais de 1000 caixotes de lixo distribuídos pelo recinto. Os bares serão 39 e a alimentação ocupará 234 metros lineares. 400 trabalhadores vão “entregar o sonho”, num evento com mais de 300 empresas envolvidas na organização e execução.

Em entrevista à PME Magazine sobre os principais desafios de organizar um festival, Roberta Medina, vice-presidente executiva do Rock in Rio, destaca a relação próxima que o evento tem com os patrocinadores e restantes stakeholders. “Nós temos uma equipa grande de parcerias, cuidando para provocar, incentivar, pensar juntos para que as marcas tirem o maior proveito das iniciativas e dos investimentos realizados”, procurando sempre “trabalhar com marcas que tenham valores semelhantes aos nossos, mas acima de tudo que tenham intenções semelhantes”.

 

PME Magazine (PME Mag.) – O Rock in Rio é conhecido pela sua capacidade de inovação e adaptação ao longo dos anos. Como é que se mantém a relevância de um festival num mercado tão dinâmico e competitivo?
Roberta Medina (R. M.) – O Rock in Rio é um festival consistente que tem trabalhado no presente a pensar no futuro e nas próximas gerações. Desde a estreia em Portugal, em 2004, que foi um grande sucesso e um marco na história do festival. Temos sentido o carinho e a aproximação do público, não só português, como de tantos países vizinhos e mais distantes que nos visitam.

um compromisso eterno de que a próxima edição seja sempre melhor

Temos uma estratégia central e consistente, focada em proporcionar experiências únicas e inesquecíveis, pensadas especialmente para o nosso cliente – que para nós está no base de tudo. Quando o Rock in Rio refere “cliente”, fala do consumidor final, do artista, do patrocinador, do fornecedor ou da equipa, de todos os seus parceiros diretos que são peças fundamentais para que tudo aconteça. Trabalhamos no sentido de reunir esforços para que o foco esteja em cada um desses intervenientes, atentos às suas necessidades e acolhendo também a inovação com uma eterna inquietude, um compromisso eterno de que a próxima edição seja sempre melhor para cada um desses stakeholders.

Trabalhamos para que todos os nossos stakeholders tenham resultados positivos e que isso faça com que a parceria com o festival se repita na edição seguinte.

 

PME Mag. – Quais são os principais desafios de organizar um evento desta magnitude mantendo o equilíbrio entre criatividade artística e eficiência operacional?
R. M. – Acreditamos que as soluções para poder criar sem impactar a eficiência operacional é criar em conjunto com quem operacionaliza, pelo que o departamento de criação não é desconectado do departamento de operações. Criamos a pensar na possibilidade de execução/ materialização da ideia, com uma troca constante de informações e inputs, muitas vezes fazendo grupos mistos de áreas e talentos distintos para que a criação saia o mais completa possível, já tendo os desafios inerentes identificados.

Essa é uma coisa boa do Rock in Rio, as boas ideias podem vir de qualquer lugar.

Esse alinhamento dentro das equipas de que a experiência única e inesquecível é o mais importante no final de contas, faz com que a nossa equipa operacional também esteja muito aberta a novas ideias, e ela própria é uma equipa que traz muitas ideias. Essa é uma coisa boa do Rock in Rio, as boas ideias podem vir de qualquer lugar. Aqui, na verdade, acho que o maior desafio no nosso caso, é que a criatividade seja planeada em uníssono com a equipa operacional, porque, na realidade, será a equipa de operações a materializar as ideias: planeamentos, timings, orçamentos, avaliar a eficácia e viabilidade, perceber se funciona ou mesmo recriar até chegar ao pretendido.

Às vezes é mais difícil ter o equilíbrio entre a criatividade e o financeiro, do que a criatividade e o operacional, isto porque a criatividade e o operacional têm o mesmo impulso: fazer acontecer. O pilar da questão da sustentabilidade financeira é um pilar mais difícil de equacionar, porque quando falamos da criativa, muitas das ideias são intangíveis em termos de resultados, então um dos desafios que normalmente colocamos na criação é ao mesmo tempo pensar como viabilizar financeiramente aquela ideia, para que mais à frente o orçamento não seja um tema.

 

PME Mag. – Como é que se coordenam tantas marcas, cada uma com o seu plano de marketing próprio, num só espaço?
R. M. – Nós temos regras previamente estabelecidas sobre o que cada marca pode fazer dependendo da categoria onde esteja. Os direitos dos patrocinadores oficiais não são iguais aos direitos do patrocinador principal, que não são iguais aos direitos das marcas que são apoio ou das marcas de operação. Assim, há uma proposta feita à sua medida, onde o mais importante, e a nossa missão, é que os direitos de uma não se sobreponham aos direitos das outras. Para isso, nós temos uma equipa grande de parcerias, cuidando para provocar, incentivar, pensar juntos para que as marcas tirem o maior proveito das iniciativas e dos investimentos realizados.

Por exemplo, existe um controlo por parte do Rock in Rio no que toca ao tipo e categoria de brindes, para que não haja um brinde semelhante, e controlamos as categorias de marcas, para que não haja concorrência. Quando entramos no segmento restauração, controlamos o tipo de produto a ser vendido e o preço praticado, para que a oferta não seja em demasia, nem os preços diferenciados, de modo que ninguém saia prejudicado. Existe uma grande equipa dedicada e focada em promover a melhor experiência possível às marcas na obtenção de resultados positivos.

 

PME Mag. – Como escolhem os patrocinadores do Rock in Rio? Têm em consideração a história e valores das marcas? Qual o peso dos sponsors no budget geral do evento?
R. M. – Há marcas que já são parceiras e essas têm prioridade na decisão, se querem estar na próxima edição do Rock in Rio ou não, obviamente com um prazo limite para essa decisão ser tomada. A partir daí, vemos quais as categorias de patrocínios estão disponíveis e vamos a todo o mercado entender e conhecer os desafios de cada marca para ver qual delas tem alguma necessidade de posicionamento, comunicação, comercial que entendamos que o Rock in Rio pode ser uma plataforma para dar suporte e apoio nessa jornada e desafio da marca.

As marcas têm um peso de 50% no investimento do festival.

Procuramos trabalhar com marcas que tenham valores semelhantes aos nossos, mas acima de tudo que tenham intenções semelhantes. Não são todas as marcas que estão no mesmo nível de maturidade, pois há marcas que estão em transição, há marcas que passam por momentos diferentes em cada fase da sua vida, e por isso avaliamos caso a caso, sabendo que às vezes há marcas com cenários mais desafiadores e, muitas vezes, nós somos um bom parceiro para conseguir contar essa história. As marcas têm um peso de 50% no investimento do festival.


PME Mag. – O que diferencia o Rock in Rio Academy de outras formações?
R. M. –
Uma das grandes riquezas do Academy é nós podermos contar os nossos casos práticos, reais, que estão a acontecer no backstage. Vocês estão dentro da nossa casa, vocês vão conhecer coisas, detalhes da nossa dinâmica enquanto equipa, enquanto empresa, mas depois têm alguém que transforma as experiências partilhadas sob forma de formação, com linguagem certa, para garantir que os takeaways são retirados daquela história.


PME Mag. – Qual é a fase mais difícil do festival?
R. M. – Existem duas fases desafiantes, dependendo do mercado: a venda do bilhete, que é vendermos o sonho, cativar as pessoas e convencer que aquele investimento vai ser bem aplicado e, sem dúvida, a fase operacional, que se materializa na hora de entregar o sonho, pois será o momento de lidar com o público e com as pessoas no geral.

Fazemos diversos planos para estarmos preparados para qualquer situação não pensada, porque estamos a falar de pessoas, que não são necessariamente previsíveis e queremos que o evento seja tudo aquilo que elas sonharam ao longo dos 10 meses de comunicação connosco. Posso destacar que essa é, realmente, a hora da grande responsabilidade, garantindo que todos tenham uma jornada completa, satisfatória e feliz, desde a hora de sair de casa até voltar do evento, com o coração cheio de energia.

 

PME Mag. – Que melhorias de sustentabilidade tem esta edição?
R. M. – Para a edição de 2024, reforçamos o nosso compromisso com a sustentabilidade com várias melhorias ambientais significativas.

A rega do Parque Tejo-Lisboa será feita com água reciclada

Desde 2016, somos um evento zero resíduos em aterro, e este ano vamos continuar a reciclar todos os resíduos gerados, graças à nossa parceria com a Sociedade Ponto Verde. Estamos ainda focados em reduzir o consumo de plástico e água com a instalação de 75 pontos de água potável para o público, para incentivar o uso de garrafas reutilizáveis, e vamos ter mais 15 para a equipa. A rega do Parque Tejo-Lisboa será feita com água reciclada, evitando o uso de água potável. Para a energia, utilizaremos biocombustível HVO da Galp, reduzindo as emissões de gases com efeito de estufa em cerca de 90%. Além disso, mais de 70% das lonas e toda a madeira usada nas cenografias serão reutilizadas ou doadas.

A nível de inclusão, vamos ter de novo uma sala sensorial para pessoas com perturbações intelectuais ou cognitivas, Língua Gestual Portuguesa no ecrã do palco Mundo, WCs não binários e audiodescrição do espaço e dos menus das zonas de alimentação. Estas são apenas algumas das medidas que fazem com que o Rock in Rio Lisboa continue a ser um exemplo de práticas sustentáveis no setor dos eventos e festivais.

 

PME Mag. – Que desafios e benefícios acarreta esta mudança da Cidade do Rock para o Parque Tejo Lisboa?
R. M. – A mudança para o Parque Tejo, num primeiro momento, foi o grande desafio de replanear o evento, de pensar e estimar os impactos financeiros de mudar para um espaço diferente, onde muitas das infraestruturas ainda precisavam de ser feitas. Essa etapa foi muito desafiadora!

Depois, chegar e conhecer o terreno, um espaço que precisava de algumas intervenções físicas, foi algo que posso também destacar como muito desafiador. Apesar disso, a vinda para o Parque Tejo é um grande presente e trouxe muito entusiasmo para toda a equipa, por podermos ganhar um mar de possibilidades de fazer crescer o evento, de poder investir em palcos maiores e de maior qualidade.
Começámos esta jornada da edição de celebração dos 20 anos a olhar para trás e a celebrar o passado, com gratidão por tudo o que já foi vivido até aqui. Quando aceitámos o desafio de vir para o Parque Tejo, começámos a falar dos 20 anos com um olhar para o futuro, das possibilidades de novas ideias, de novos espaços, de novas atrações. Temos à nossa frente muito mais liberdade física para criar as próximas edições, enquanto executamos esta já estamos a pensar em ideias que possamos implementar nas futuras. E claro que, como prometido, ainda vamos escutar o que o público prefere, mas nós estamos muito apaixonados pelo Parque Tejo.