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Ângela Morgado
Ângela Morgado, fundadora e diretora-executiva da ANP|WWF (Fonte Divulgação)

“Queremos que as pessoas dediquem essa hora desse dia [23 de março] a fazer algo pelo ambiente” – Ângela Morgado

Por: Ana Vieira


Conhecido como o momento das “luzes apagadas”, desde 2007, e pela mão da World Wide Fund for Nature (WWF), que pessoas em todo o mundo desligam as luzes, num gesto simbólico, para aumentar a consciência sobre as questões ambientais.

Nos últimos anos, o movimento tem tentado adicionar mais valor ao gesto simbólico inicial, dando origem a ações, mostrando que os comportamentos e as opções de cada um, contam, com a campanha “pequenas ações, grande impacto”.

Em entrevista à PME Magazine, Ângela Morgado, fundadora e diretora-executiva da ANP|WWF, salienta que se trata de “um erro acharmos que temos de modificar tudo de forma abrupta, pois não é viável. A mudança, para ser efetiva, tem de ser feita ao ritmo de cada um e realizando coisas que cada um gosta”. 

 

PME Magazine (PME Mag.) – Como tem sido a mobilização dos portugueses na adesão à Hora do Planeta (dia 23 de março)?
Ângela Morgado (A. M.) – A Hora do Planeta surgiu em 2007 na Austrália e, logo no ano seguinte, Portugal foi um dos 35 países que aderiram à iniciativa, o que demonstra que o tema já naquela altura era, de alguma forma, relevante para o nosso país. Como a ANP|WWF organizou as 15 edições (a de 2024 é a 16.ª), não tenho dúvidas em afirmar que se tem registado uma enorme evolução. As pessoas têm aderido cada vez mais, quer nas suas casas quer em eventos criados pelos municípios, pois percebem que a mudança também passa pelas suas mãos. De uma forma geral, os mais jovens são os mais comprometidos e os que mais mobilizam, e isso deve-se também ao importante papel que as escolas estão a ter ao trabalhar este tema em várias disciplinas e ações. Destaque para o facto de crianças e jovens terem um desempenho fundamental na alteração de paradigma, na medida em que “contaminam” familiares de gerações mais velhas, os mais resistentes a alterações por terem enraizados hábitos de vários anos. Apesar de ainda haver muito a fazer, é inegável que estamos no bom caminho.


PME Mag. – Se, por um lado, há cada vez mais informação acerca da sustentabilidade do planeta, há também mais negacionistas e empresas que usam o tema numa vertente estritamente comercial (greenwashing). Como é que a iniciativa Hora do Planeta se posiciona?
A. M. – A Hora do Planeta é uma iniciativa da WWF a nível mundial que tem um objetivo claro: chamar a atenção para os efeitos das alterações climáticas na vida da Terra (secas, degelo, aquecimento global, desflorestação, extinção de espécies…) e a necessidade de encontrar soluções efetivas, construtivas e galvanizadoras para minimizar todos os danos já infligidos e evitar danos futuros. O nosso trabalho está assente em dados científicos, os quais estão em constante evolução e verificação. Negar estes dados é pôr em causa o futuro da natureza, da qual todos dependemos. A solução para assegurarmos um futuro para todos passa necessariamente por cuidarmos, restaurarmos e protegermos o Planeta de quaisquer práticas e comportamentos nocivos.


PME Mag – Em que consiste a campanha “pequenas ações, grande impacto”?
A. M. – A Hora do Planeta começou quando 2,2 milhões de pessoas e mais de 2 mil empresas apagaram as luzes durante 60 minutos em Sydney, não para poupar energia, mas como alerta sobre a perda da natureza e a necessidade de nos desligarmos do que é acessório e de nos reconectarmos com o que é essencial: a Terra. Porém, nos últimos anos, este movimento — que já tem raízes em mais de 190 países e territórios (90% do Planeta) — evoluiu e tem tentado adicionar mais valor ao gesto simbólico inicial: queremos que as pessoas dediquem mesmo essa hora desse dia a fazer algo pelo ambiente. Por isso, em 2023 foi criada oficialmente a campanha ‘pequenas ações, grande impacto’, a qual pretende mostrar às pessoas que os seus comportamentos e as suas opções contam.

Na prática, isto significa que, se cada indivíduo alterar um pequeno hábito no seu dia a dia, tudo somado vai fazer uma grande diferença. É um erro acharmos que temos de modificar tudo de forma abrupta, pois não é viável. A mudança, para ser efetiva, tem de ser feita ao ritmo de cada um e realizando coisas que cada um gosta. Por exemplo, quem adora exercício físico, pode ir de bicicleta para o trabalho. Os que apreciam moda — uma das indústrias mais poluidoras — também podem reutilizar peças de roupa antigas ou fazer trocas com família e amigos. No fundo, o importante é que cada um tenha consciência plena de que é agente da mudança e responsável pelo futuro do ambiente.

 

PME Mag. – Como vai funcionar o Banco de Horas, disponível no site da Hora do Planeta?
A. M. – O Banco de Horas — que está pela primeira vez disponível online e para todos em qualquer parte do mundo — tem duas funções. A primeira é fornecer uma listagem de ações sustentáveis de várias áreas, no sentido de dar ideias simples e divertidas às pessoas, para que, de forma individual ou em grupo, possam dedicar uma ou mais horas ao Planeta. Por outro lado, este banco também tem como objetivo que cada indivíduo, empresa, município ou organização registe o número de horas doadas e a(s) atividade(s) que fez ao longo de todo o dia 23 em prol do ambiente. Estas informações permitem contabilizar a nível mundial quantas horas foram devolvidas ao Planeta e também ter uma noção mais exata das iniciativas mais realizadas.

No ano passado já houve um Banco de Horas, no qual só os participantes dos eventos da WWF tinham possibilidade de fornecer os dados do tempo dispensado, tendo-se registado 410 mil horas de forma global. Portanto, neste ano, a iniciativa é mais universal e espera-se que cada um contribua com a sua informação para se criar a Maior Hora pelo Planeta. Os registos na plataforma são possíveis de fazer até ao dia seguinte (domingo 24).


PME Mag. – Além das pessoas, pretendem envolver mais os municípios. Quais os municípios que mais dinamizam ações de sensibilização e quais, por exemplo, poderiam ser adotadas por outros.
A. M. – Para se perceber a evolução, a Hora do Planeta contou com 11 municípios na sua primeira edição, sendo que no ano passado participaram 88. Para nós, as autarquias são peças-chave para promover a mudança efetiva de comportamentos ambientais, na medida em que há uma relação de proximidade com as pessoas. Além da divulgação do evento (cartazes nas ruas e informação no site e nas redes sociais), estas entidades também podem organizar atividades para a Hora do Planeta que mobilizem os cidadãos. Há municípios — como o de Cascais e o de Famalicão — que desde o início (2008) colaboram com este evento. Iniciativas coletivas como caminhadas, observação de estrelas, passeios de bicicleta, ioga, danças & cantares e refeições sustentáveis são alguns exemplos do que é possível fazer em comunidade e que tem tido ótimos resultados.

 

No Mercado de Alvalade, em Lisboa, decorrerá este sábado, dia 23 de março, o Arraial Hora do Planeta, com diversas oficinas.