Por: Ana Vieira
- O maior desafio para as PME portuguesas mantém-se, pelo terceiro ano consecutivo, a gestão de pessoas (Recursos Humanos).
Quais são as principais dificuldades das PME na contratação e retenção?
Perante os resultados do Barómetro, o economista João Duque é claro: «Who pay peanuts, get monkeys”, (tradução livre “Quem paga amendoins, recebe macacos”)». “Para contratar e reter talento é preciso pagar bem, criar um ambiente e dar um propósito. Hoje não é apenas a remuneração que está em cima da mesa, principalmente para as gerações mais jovens”.
Não obstante, o professor e presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão – ISEG ressalva a importância das remunerações “quando se comparam salários de 1.300 com 3.500 euros, o típico que se encontra quando se comparam as condições oferecidas pelas empresas portuguesas a jovens recém-licenciados ou mestres, com os salários que empresas do centro da Europa oferecem.”
“As empresas não estão a ser competitivas no mercado internacional ou local, ao ponto de poderem pagar bem aos seus recursos”, conclui João Duque, apontando poucas áreas onde esta questão não se coloca.
Na mesma perspetiva, Afonso Carvalho, presidente da Associação Portuguesa das Empresas do Setor Privado de Emprego e de Recursos Humanos, aponta três grandes vetores que dificultam a contratação: oferta, competitividade e eficiência.
Do lado da oferta, a “escassez de trabalhadores sobretudo se entrarmos no campo mais técnico e especializado, campo esse que é crítico em alguns setores de atividade em que a maioria das PME opera, e se juntarmos a localização geográfica, fora dos grandes centros urbanos, então poderemos estar perante uma tempestade perfeita”.
Ao nível da competitividade, Afonso Carvalho aponta a escassez de recursos financeiros que tornam as PME portuguesas menos competitivas, em comparação, sobretudo com as “multinacionais, o que condiciona fortemente, e cada vez mais, a possibilidade de praticar salários mais altos, oferecer pacotes de benefícios diferenciados e que maximizam a proposta de valor e, não menos importante, a capacidade de criar espaços de trabalho e ecossistemas onde os trabalhadores sintam que podem crescer, aprender e desenvolver”.
Por fim, a eficiência. Além do fator humano, o presidente da Associação Portuguesa das Empresas do Setor Privado de Emprego e de Recursos Humanos, sublinha a importância das PME adotarem “mecanismos eficientes de identificar, selecionar e recrutar trabalhadores (inteligência artificial e machine learning)”, para competir com as empresas que já usam “processos de triagem automatizados, análise preditiva suportada por avaliações psicométricas e na fase de entrevista, chatbots e assistentes virtuais”.
Mais do que incentivos pontuais na conquista de novos trabalhadores, Afonso Carvalho aponta fatores como a “inovação e flexibilidade aliada a ambientes de trabalho que promovam a saúde mental, o equilíbrio trabalho-família e oportunidade de desenvolvimento profissional”, como medidas que verdadeiramente poderão fazer a diferença na hora de assinar contrato.
Como vão as PME reforçar quadros nas áreas de operações e vendas?
- 51% dos CEO’s ou cargos de direção prevê reforçar a equipa na área das operações e 27,5% nas vendas.
Perante os dados do Barómetro, Afonso Carvalho destaca duas ideias: maior rotatividade e criação de novas empresas.
“Historicamente as equipas de vendas são aquelas que apresentam maior rotatividade, no entanto, quando uma empresa cresce em número de recursos a principal vaga de contratações ocorre nas equipas operacionais e de vendas ou de suporte às vendas dado que as áreas de suporte (recursos humanos, financeira, etc.) têm na maior parte dos casos alguma capacidade de absorver picos de crescimento”.
Quanto às características mais valorizadas para um colaborador desta área, “creio que é seguro dizer que existe uma base comum e que se reflete em valores como a integridade, ética, resiliência, persistência, empatia e conhecimento técnico das tarefas e do mercado onde vão atuar”.
No caso dos perfis mais operacionais, Afonso Carvalho destaca, de uma forma genérica, a “capacidade crítica, resolução de problemas, gestão de tempo e a flexibilidade”, nas vendas, a “comunicação com impacto, orientação para resultados, espírito de equipa e autonomia”.
Como recorreram as PME a apoios financeiros?
- O recurso a apoios financeiros voltou a diminuir quase 10 pontos percentuais (p.p.) em 2023. 35,7% das empresas que foram apoiadas fizeram-no através da banca (25,6%), seguido de apoios à contratação e manutenção de postos de trabalho (9%).
Nuno Marçal Moita, diretor da Iberinform Internacional Sucursal em Portugal, conclui que pode haver uma “uma maior robustez das empresas”, ou “uma abordagem mais contida e prudente em relação aos financiamentos/investimentos”, resultado das empresas estarem a tornar-se mais “autossuficientes ou estarem a implementar estratégias mais conservadoras em relação ao endividamento”.
Quanto à banca ocupar a primeira posição na escolha das PME na obtenção de apoios, Nuno Marçal Moita alerta para a importância de se olhar para todas as opções disponíveis.
“As empresas devem considerar se é ou não a opção mais vantajosa ou se é a mais simples. A banca pode oferecer taxas de juros competitivas e estruturas de pagamento flexíveis, mas é vital avaliar todas as opções disponíveis, incluindo financiamento por investidores, linhas de crédito alternativas e programas de apoio governamentais”.
Como gerem as PME o risco financeiro?
- Quase 80% das PME não usa ferramentas de gestão de risco, sendo que 43,5% desconhece a sua existência.
Uma conclusão “preocupante”, afirma Nuno Marçal Moita, da Iberinform. “Existem no mercado inúmeras ferramentas que ajudam as empresas a gerir o risco a custos reduzidos e com soluções adequadas às micro, pequenas e médias empresas”.
Por exemplo, “atualmente tomar decisões sobre a atribuição de crédito a um cliente é facilmente interpretável através de modelos de risco desenvolvidos para estes segmentos, fazendo com que as empresas estejam menos expostas a situações de incumprimento”.
Quais são as principais preocupações financeiras das PME?
- A falta de liquidez, os atrasos nos pagamentos por parte de clientes ou o crédito malparado – tesouraria e fluxo de caixa (25,1%) – estão no topo das maiores preocupações para as PME na gestão de risco.
“Estas preocupações destacam a importância de uma gestão eficaz do fluxo de caixa e da tesouraria, bem como estratégias proativas para lidar com clientes incumpridores e mitigar os riscos financeiros”.
Como tal, as “PME precisam direcionar mais atenção e recursos para a gestão de risco de forma a proteger a sua saúde financeira e a sustentabilidade”, conclui Nuno Marçal Moita, da Iberinform Internacional Sucursal em Portugal.