Quinta-feira, Março 6, 2025
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Comunicar bem para Liderar melhor – A Voz que (se) Ouve

Por: Paula Perfeito, presidente da PWN Lisbon (Professional Women’s Network) 


A comunicação está no cerne de todas as interações humanas e pode parecer simples, à primeira vista, mas carrega um poder imenso: o de influenciar bem (ou mal). O de levar as pessoas connosco ou o de as ter contra nós. Unir ou separar. E essa dualidade está em todos os planos da comunicação: pessoal, familiar, profissional, social… verbal, não verbal, escrito, visual. Comunicar consiste nesse ato de saber usar a voz da comunicação e isso pressupõe, simultaneamente, fazer-se ouvir e ouvir. Na liderança, essa lição é rainha. Olhemos, para a entendermos melhor, para três dimensões da comunicação que redefinem a forma de liderar: estratégica, técnica e relacional.

1. Desenhar uma estratégia de comunicação pressupõe um sentido coletivo

Larguemos os bitaites lançados da bancada, porque o trabalho científico está feito e podemos consultá-lo. As Ciências da Comunicação oferecem-nos um património de conhecimentos fortíssimo para entendermos a comunicação como ferramenta estratégica de liderança, apoiando-se nas teorias da comunicação para fazer a leitura e interpretar os fenómenos de produção, difusão, receção e efeitos dos conteúdos. Nascida nos EUA, em 1927, a Mass Communication Research integra diferentes disciplinas e, ao longo do tempo, sublinha a tendência para a convergência entre as tradições americana, focalizada nos efeitos cognitivos implícitos ao sistema dos media, e europeia, voltada para a relação entre os novos media e o sistema social.

Podemos identificar várias teorias de comunicação, que vão desde a Teoria Hipodérmica, centrada no paradigma psicológico behaviorista com um emissor muito ativo; passando pelo Modelo de Harold Lasswell, que introduz as questões fundamentais em comunicação: Quem? (controlo pelo emissor), diz o Quê? (conteúdo), a Quem? (audiência), através de Que canais? (meio), com Que efeitos? (problemática dos efeitos no público); a Abordagem da Persuasão, que evolui para a relevância da audiência e da mensagem; a Teoria Funcionalista, que deixa de perguntar o que fazem os mass media às pessoas? e passa a questionar o que fazem as pessoas com os mass media?; ou a Teoria Crítica, centrada na tecnologia e no impacto da forma de comunicarmos.

Se ligarmos este quadro resumo à história entre o homem e os media, avaliamos três grandes culturas: 1) a Cultura Acústica, própria das sociedades não alfabetizadas, com predominância da palavra oral, promotora do ouvido e da criatividade, quer de quem fala, quer de quem ouve; 2) a Cultura de Gutenberg, que remete para o alfabeto, considerada a mais importante invenção tecnológica de sempre, assente na predominância do olho, do raciocínio linear, da lógica; 3) e a Cultura Eletrónica, que nasce em 1844 com a invenção do telégrafo (que separa a mensagem do mensageiro), baseando-se na instantaneidade, velocidade da difusão, receção em massa.

Ora, com a predominância da tecnologia, há que olhar com atenção para o meio através do qual transmitimos uma mensagem. De acordo com o canadiano Marshall McLuhan (1911-1980), o meio, comummente entendido como canal inócuo de transmissão, é determinante do processo de comunicação, estando na génese, aliás, dos diversos mecanismos de apreensão e perceção do real. Vivemos num alojamento local com acesso global, não pelo facto de podermos contactar qualquer pessoa em qualquer parte do mundo, mas porque as informações cercam os indivíduos ao mesmo tempo e num mesmo espaço simbólico, o dos media eletrónicos.

2. Para além da visão estratégia, ganhemos um pragmatismo estratégico

Ao transferirmos este quadro das Ciências da Comunicação para a vida das organizações, percebemos que nos oferece um património de conhecimentos hábil para entender a comunicação como poder, clarificando como, no universo organizacional, o domínio técnico desse quadro conceptual coloca a comunicação ao serviço de uma melhor liderança.

À medida que as organizações se tornam culturalmente mais diversas, com negócios mais globais, ambientes tecnológicos pautados pela inteligência artificial e novos postos de trabalho, as skills qualitativas – como a comunicação – são cada vez mais relevantes para estabelecer relações consistentes, interpretar interações e adaptar comportamentos e abordagens às diferentes circunstâncias e aos diversos interlocutores.

Na componente técnica, há, pois, que cuidar dos cinco aspetos fundamentais e fundacionais da comunicação: emissor (que deve traduzir máximos níveis de credibilidade, autoridade e idoneidade); audiência (com quem estou a falar?); conteúdos (que devem estar adequados a essa audiência); formato (que deve ser acessível para poder ser apreendido); e meio (através do qual devo comunicar).

Interiorizados os seus agentes, pensemos que a comunicação começa pela resposta à pergunta: o que é que eu quero dizer? Para que aquilo que quero dizer tenha impacto, devo mapear 10 mandamentos indispensáveis: 1) clareza; 2) rigor; 3) voz assertiva; 4) perguntas poderosas; 5) escuta ativa; 6) empatia; 7) resolução de conflitos com afirmação; 8) linguagem corporal; 9) apresentação; 10) e autenticidade.

3. Devemos ter a melhor visão estratégica e tática, mas o que vai mexer com a audiência é o nosso território de singularidade, autenticidade e verdade

A componente relacional pressupõe ter a inteligência, a sabedoria e a sensibilidade para criar uma relação com quem está a ouvir-nos; escutar, dar a voz e o brilho a quem nos ouve; criar as condições para que nos compreendam e interiorizem a nossa mensagem, que é suposto acrescentar, enriquecer a audiência. Na comunicação, esse conceito relacional, não falamos para nós nem connosco. Não somos nós que estamos do outro lado. A transmissão de mensagens deve estar ancorada na interação, no diálogo, na relação. Comunicar não é estar ao espelho para nos enfatizarmos refletidos; é projetar no outro o melhor que se tem com o desiderato de o motivar à irreverência de fazer o mesmo. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) falava, nem de propósito, do palco como «lugar de elevar consciências».

Já a escritora brasileira Clarice Lispector (1920-1977), incontornável no panorama literário do século XX, e incorrigivelmente atual, escreveu assim: «Vocação é diferente de talento. Pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir». Admito que facilite que haja uma vocação inata para a comunicação, mas é importante juntar-lhe o talento, ou seja, a capacidade de colocar na vocação uma intencionalidade, saber aplicar, conduzir, direcionar essa vocação. E para juntar as duas há que ter determinação, foco, perseverança, obstinação, muito trabalho.

Tenhamos mais ambição na comunicação. O mesmo é dizer, atrevo-me a dizê-lo, façamos algo memorável, que nos transcenda, que tenha impacto no outro. Não é para isso suposto sermos perfeitos. Mas sejamos autênticos. E a nossa liderança será única.

 

Parceria PME Magazine/PWN Lisbon 
Este artigo faz parte de uma parceria editorial estabelecida entre a PME Magazine e a PWN Lisbon (Professional Women’s Network).

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